31 de julho de 2009

O QUE AÍ VEM... Alice no País das Maravilhas












GULA. «Em todas as outras versões da história que vi, nunca senti uma verdadeira ligação, não só por causa da natureza da obra que segue uma série de acontecimentos como pelo facto das personagens serem estranhas.»TIM BURTON

Se há cineasta que nos está a fazer acreditar outra vez em contos de fadas é Tim Burton. Quando se pensa que o mesmo não pode ir mais longe, eis que um novo projecto, de cariz bizarro e arriscado, nos faz acreditar novamente no vigor do cinema fantástico.

ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS é já o mais desejado filme dos próximos tempos, até porque Burton veio dizer que quer dar à história de Lewis Carroll o tom onírico que ela nunca teve.

Basicamente o que se pode esperar é um filme para toda a família, mas sem ser bem comportado, até porque Tim Burton tem uma paixão secreta (ou, se calhar, não assim tão secreta...) pelo lado negro das coisas. E não há nada de tão cruel do que um conto infantil...

Será preciso esperar ainda uns bons meses para se comprovar como será esta luxuosa produção, mas há alguns detalhes que só aumentam o apetite... Desde logo, Burton convoca os seus parceiros de outros trabalhos para esta fábula, seja a esposa Helena Bonham Carter na pele da Rainha de Copas ou o camaleónico Johnny Depp como o Chapeleiro Louco - na já sétima colaboração com o criador de «Eduardo Mãos de Tesoura».

Pelo aspecto das primeiras imagens, mostra-se que Depp continua a querer ir tanto mais longe na desconstrução do seu aspecto quanto possível...

Para o papel de Alice, a jovem que entra num mundo de coordenadas diferentes, está a quase desconhecida Mia Wasikowska, jovem platinada com leves traços de Gwyneth Paltrow. Mas as surpresas não ficam por aqui: Michael Sheen será o coelho branco (!) e há ainda Anne Hathaway, Alan Rickman, Stephen Fry e o velho parceiro Christopher Lee (cada vez mais perto da bonita idade de 90 anos).

Em matéria de banda sonora, podemos ficar descansados: caberá a Danny Elfman, mais uma vez, traduzir em sons o que vai na mente de Burton.

TIM BURTON TAMBÉM ERRA
O CINEMA COMO CIRCO: ONDE ENTRA BURTON?

30 de julho de 2009

NA SALA ESCURA: Duas formas de rir










SOBERBA. «Posso dar-vos um conselho? Cortem as barbas porque esse ar de Rei Osama parece o de um feiticeiro sujo... ou de um Pai Natal sem abrigo.» Brüno (Sasha Baron Cohen)

Uma vem do outro lado do Atlântico, com paragens no Médio Oriente, em África e génese na pacífica Áustria. A outra quer-se tipicamente britânica, mesmo tendo entre o seu elenco o nome de Philip Seymour Hoffman. Para lá disso, são duas propostas interessantes do cinema comercial em matéria de bom humor. E não é que fazem mesmo rir?

Se, por um lado, BRÜNO representa a mais recente bizarria cinematográfica de Sasha Baron Cohen - cada vez mais interessado em chocar, ainda que em nome da sátira deliciosamente vistosa e nada, nada politicamente correcta -, por outro O BARCO DO ROCK é o mais recente título da Working Title, desejoso de bisar o êxito de outros trabalhos cómicos como «O Diário de Bridget Jones», «Notting Hill» ou «O Amor Acontece».

No primeiro caso, o que temos? Uma visão muito pouco convencional sobre os meandros do mundo da moda e direito a mais uma «personagem-obsessão» de um dos mais interessantes e arrojados fenómenos do cinema comercial.

Sasha Baron Cohen é inclassificável, inteligente e muito convencido das suas potencialidades artísticas. É o actor a fazer-se passar por actor, o artista que se confunde com a personagem, numa perversão sem limites, como que a satirizar o método mais compulsivo de algumas estrelas.

Tal como em «Borat», aqui pouco se percebe onde acaba a ficção e começa a realidade em registo imprudente de apanhados. Sasha Baron Cohen está muito pouco interessado em desfazer as dúvidas. O que se sabe é que há uma persona para alimentar em nome de uma boa ideia.

E quem é este Brüno? Um homem da moda austríaco que decide ser estrela famosa em Hollywood. Para tal, começa por pensar que ser gay estridente lhe pode valer uns pontos na subida ao sucesso, filma-se nas suas tentativas para produzir um programa de celebridades e tenta copiar hábitos de figuras famosas, como adoptar uma criança africana. Mas esta descrição é redutora: a comédia, que foi êxito nos Estados Unidos, é muito mais diabólica e pouco condescendente com moralismos.

Brüno quer ser ousado e consegue-o, enquanto se diverte a desmistificar as incongruências de uma certa mentalidade norte-americana. Sasha Baron Cohen vai, por vezes, longe de mais, expõe-se e expõe o espectador ao embaraço. Quase sempre consegue fazer soltar uma gargalhada, noutras vezes limita-se a repetir números que já divertiam em «Borat».

Ou seja: a figura entra facilmente no registo da galeria de personagens marcantes de Baron Cohen, mas também representa um ponto-limite... Se continuar por este registo, rapidamente se desgastará e o efeito-surpresa pode estar comprometido. BRÜNO diverte, choca, embaraça, satiriza. Mas isso «Borat» também já fazia. Cabe a Sasha Baron Cohen reinventar-se outra vez no próximo projecto.

Num registo mais polido e preparado para agradar ao grande público, O BARCO DO ROCK quer ser uma homenagem à música e ao esforço meritório das rádios-pirata numa época em que os bons costumes gostavam de boicotar movimentos artísticos que rompessem com o estabelecido.

Esse recuar no tempo tem alguma graça e Richard Curtis é hábil na introdução de figuras.

O realizador de «O Amor Acontece» repete, contudo, o mesmo problema da sua obra anterior: tem dificuldade em construir uma história suficientemente sólida para se manter do princípio ao fim. Opta por relatos episódicos, gosta de dispersar-se pelas personagens, como que a evitar maior profundidade narrativa. Algo que eleva o humor, mas que penaliza o efeito global da história.

Ainda assim, o tom ligeiro e descomprometido torna O BARCO DO ROCK numa proposta agradável, das mais consensuais dos últimos meses. A vontade em expor hábitos de outros tempos e de brincar com personalidades mais libertinas também encontra eco no elenco mais cool da temporada: por aqui passam Bill Nighy, Philip Seymour Hoffman (a respirar de alívio dos seus desempenhos mais densos que viveu recentemente), Nick Frost ou Rhys Ifans. Até Emma Thompson faz uma perninha...

Do lado dos vilões, está um caricatural Kenneth Branagh, membro do Governo britânico que sonha em acabar com as rádios-pirata. Se o actor, por um lado, é exímio em ser ridículo com gosto, por outro este lado da autoridade é cansativo e mal explicado em todo o filme.

No entanto, O BARCO DO ROCK quer homenagear a música. E essa vontade em recordar temas de sempre, passando por nomes que vão de Otis Redding, The Beach Boys, Cat Stevens ou David Bowie, é meritória. Uma certeza: dá vontade de ir logo a correr comprar a banda sonora!

BRÜNO
De Larry Charles (2009)
* * *
O registo politicamente incorrecto continua e aqui Sasha Baron Cohen sente-se como peixe na água. A brincar à sexualidade, ao mundo da moda, aos falsos moralismos, à fama, tudo entra nesta bizarra jornada por uma América confusa com o seu glamour. Mas há ainda hilariantes jornadas pelo Médio Oriente e por África. Brüno pode ser demasiado estridente e cansativo, mas é também icónico e ousado. O tom do filme diverte, mas é também um sinal de que Baron Cohen precisa de inovar sob pena de cair em mais do mesmo.

O BARCO DO ROCK
De Richard Curtis (2009)
* * *
O espírito transgressor de quem se dedica à música moderna num tempo de conservadorismos é uma boa ideia. As memórias da rádio pirata são bem resgatadas e o feel good spirit é um bem necessário para o cinema de massas. Aqui, nada a dizer. A história diverte, as personagens também. Falta é alguma solidez em tudo isto... mesmo que a homenagem aos grandes nomes do pop-rock seja bem oleada.

28 de julho de 2009

OS MEUS POSTERS: O Cavaleiro das Trevas







































SOBERBA. Regresso à génese desta secção, que é mostrar cartazes alusivos de um filme que sejam mais do que isso. Neste poster pouco conhecido de O CAVALEIRO DAS TREVAS, consegue-se captar na perfeição a ironia da verdadeira alma (ainda que demoníaca...) deste filme. É também uma forma de lembrarmos Heath Ledger, numa das suas mais complexas e vorazes interpretações. Será que se pode chamar a isto obra de arte?

27 de julho de 2009

O meu amigo escritor

INVEJA. «Toda a gente tem uma ideia para escrever um livro, a dificuldade está precisamente em passar da ideia para o livro. É preciso ganhar coragem para passar da inspiração para a fase da transpiração.» MIGUEL CARDOSO PEREIRA in A Bola

Na capa vem escrito Miguel Cardoso Pereira, mas para mim o autor de AMOR DOS BABUÍNOS será sempre o meu amigo Zé .

Ou melhor, o Zé é Miguel Cardoso Pereira quando se agarra às palavras, as articula numa preciosa mistura discursiva e as molda para dar forma a um confessional romance que não é mais do que uma visão profunda sobre o sentido do amor e da morte. Ou sobre a falta dele.

Quando a apetência se faz sobre o cinema e as suas imagens, li o livro do meu amigo Zé e foram novamente imagens que se formaram na mente, pela hábil capacidade em criar expressões de sentido figurado, metáforas inteligentes e muita ironia. Além de um romântico, Zé é também um observador atento das incongruências do dia-a-dia. O episódio no centro comercial com a avó ou os instantes de alienação no banco de uma sala da faculdade com uma «caneta para halterofilistas» mostram que por aqui as ideias fervilham.

Em AMOR DOS BABUÍNOS, a escrita não é totalmente fluída, impõe constantes travões pela melhor das causas: cada frase tem a postura imponente da singela poesia e o tom cortante das reflexões sobre a condição do ser humano. E o que queremos desta vida? Viver. Sentir na pele as marcas dos momentos que nos definem. Amar. Estarmos juntos.

É certo que na escrita do Miguel passa também aquele tom intimista, melancólico, triste dos que sofrem. Mas quem é que não sente o peso das contradições? Quem é que não tem receios? Ao deixar-se submergir nas vozes (e nos corpos) de um casal, que possuem muitos inícios e fins numa longa jornada sentimental, o Miguel expõe uma escrita madura, crua e muito segura de si.

Exemplos? «Tu, dentro de mim, és escuro, mas é o meu céu. Neste dia és o céu de todos os céus do planeta, ainda que sejas negro, sem luz por dentro, sejas dia sem luminosidade. Sejas um fogo que arde nas cinzas e não nas chamas. Não sei se quero ir, mas vou. Ou melhor: não vou, não é bem isso, não é propriamente uma decisão que tomo, não tenho idade para tomar decisões. As decisões são o contrário dos gostos. Um gosto não é uma decisão.»

Mais um? «A piada é que envelhecer tem destas coisas: cada ano que passa um estranho é mais estranho que antes. Quando eu era miúda, um estranho não estava tão longe como tu pareces estar. O crescimento impede que um estranho entre tão facilmente na nossa vida. Na meninice ninguém é estranho, é uma lei básica da inteligência.»

Mais sobre AMOR DOS BABUÍNOS

Demorei algum tempo a perceber que o meu amigo Zé era também o Miguel da escrita. Há surpresas boas como esta... No dia do lançamento do seu livro, o Miguel (que é também o meu amigo Zé) explicou que partiu a sua história em pequenos capítulos com datas, porque elas simbolizavam os pequenos fins ou começos que definem as nossas lembranças. Ou seja: a memória não é mais do que o filtro que nos remete para algo que começa ou acaba.

Pois bem, O AMOR DOS BABUÍNOS é um gigantesco começo para a vida do Miguel e do meu amigo Zé. É também um começo para quem o lê e o conhece de perto: sabe que este é o ponto de partida para algo muito maior.

18 de julho de 2009

ILUSÕES DE ÓPTICA: Lembrar Captain Blood

Há piratas na Cinemateca!













IRA. «Um casamento? Adoro casamentos... Há bebidas por todo o lado.» Jack Sparrow (Johnny Depp)

É uma questão de bom gosto. Já aqui falei em diversas ocasiões das vantagens de se ver um filme na esplanada. A Cinemateca insiste no óptimo ritual de Verão que, neste mês de Julho, é dedicado inteiramente aos filmes de capa e espada, a tradução possível para um género que fez história em Hollywood: o swashbuckler.

Para tal, recorda não só os clássicos de sempre - começou por exibir A Rainha dos Piratas, do excelente Jacques Tourneur - como o maior êxito moderno dentro deste género, capaz de tornar Johnny Depp numa super-estrela: caso de O PIRATA DAS CARAÍBAS: A MALDIÇÃO DO PÉROLA NEGRA, que está agendado para o próximo dia 25.

E o que prometem estes serões? Um calor motivado por aventuras, rebeldia e vontade em fazer uma forma peculiar de justiça. Há acção, duelos entre heróis e vilões e, especialmente, anti-heróis.

O bom gosto de quem agendou o ciclo «Piratas a Cores na Esplanada» faz com que se lembre, por exemplo, «No Reino dos Corsários», de George Sherman, que será exibido esta noite. Trata-se de mais um trabalho com o inevitável Errol Flynn, herói para toda a família que sai ileso de um género e enaltecido pela força do technicolor. Neste movimentado jogo de encruzilhadas, o duelo será com Anthony Quinn...

Lembra-se ainda «O Barba Negra», de Raoul Walsh ou «Tempestade na Jamaica», de Alexander Mackendrick. Neste excelente «baú de memórias cinéfilas», o melhor mesmo é consultar a programação completa para não se perder pitada. As noites prometem aquecer na Rua Barata Salgueiro.

17 de julho de 2009

Dar umas luzes aos irmãos Lumière (X)











Caros irmãos Lumière,

É estranho o fado do cinema português. Nunca conseguiu recuperar o seu lugar mediático desde que o pequeno ecrã invadiu o quotidiano do povo. Antes, nos tempos áureos da rádio e do convívio de bairro, que é como quem diz no Estado Novo, havia o hábito de ir ao cinema e este nunca teve tanto peso como nesses tempos.

É certo que havia controlo, algum condicionalismo, mas havia graça, sátira e genuíno humor popular. Foi um raro momento (as décadas de 1940 a 60) de compatilidade entre o que se queria filmar e o que se queria ver. Pode dizer-se que era um cinema formatado, pouco criativo e até redutor. Mas a lógica e as barreiras são as que a televisão sofre no dia de hoje: a questão sobre o descontentamento dos produtos é facilmente contornada por quem manda com os níveis de audiência.

Mas será que o cinema deve ser como a televisão é hoje em dia? A meu ver, enquanto arte de apelo global, deve permitir todo o tipo de produtos. Desde os de apelo mais popular, fácil consumo, argumento menos arisco, até ao experimentalismo, produtos de nicho, que testem convenções formais e dramáticas. Só que em Portugal existe um problema: fazer um filme é caro e... não há dinheiro.

Esta constatação transpõe a indefinição do cinema português para o limbo dos critérios de atribuição de subsídios... Pode dar algum orgulho a vontade em apostar em projectos novos, arriscados, mas o cinema não se pode dar ao luxo de ser pensado de costas voltadas para o público.

Sim, neste momento, fazer um filme pode ser uma experiência de tal forma solipsista que até assusta! Há projectos que chegam às salas com 300, 400 bilhetes vendidos, o que é impensável para uma arte que se quer renovar.

E o público precisa de cinema! É por isso que se deve louvar quem consegue um equilíbrio entre arte e devoção pelo espectador.

Lembro-me disso a propósito de «Call Girl» de António-Pedro Vasconcelos. O filme é um novo caso de cinema maduro pela mão do mesmo realizador de «O Lugar do Morto», com uma intriga que tenta reflectir os receios de que o poder pode minar a consciência. Ao articular uma história policial com a corrupção de um autarca, e o jogo de sedução de uma prostituta de luxo, António-Pedro Vasconcelos cria um novelo inteligente, que tenta evitar (sempre que pode...) a mera caricatura, aproveitando ainda óptimos valores de produção, excelente fotografia e bons desempenhos.

Sentem-se por aqui estilhaços de «film noir», uma obsessão por uma mulher que até recorda «O Anjo Azul», de Josef von Sternberg, ecos de «Instinto Fatal». Soraia Chaves é o corpo de quem todos falam, mas é também a musa certa para um filme que encontra rapidamente o seu rumo.

Só é pena que para chegar às massas tenha de condensar no «trailer» todas as cenas de sexo e ousadia que se vislumbram no filme (a maioria bem filmadas, é certo). Mostra que há, por outro lado, uma incapacidade em tornar um filme rentável sem ceder às fórmulas básicas de sempre...

Para onde caminha o cinema português? Sem grande linha definida, lá se vai desenvolvendo à custa de projectos cujo critério de aprovação é dúbio. Mas há honrosas excepções: João Canijo, Marco Martins, Jorge Cramez, Mário Barroso, António da Cunha Teles, Joaquim Leitão e a dupla Tiago Guedes e Frederico Serra são sinais de esperança.

14 de julho de 2009

QUIZ: A que filme pertence esta imagem?












Foi uma descoberta recente, apesar de ter uns bons aninhos que... se recomenda. É um hino à improvisação e a um certo cinema verité, só que em solo norte-americano. Alguém arrisca um palpite?

Solução do QUIZ anterior: Em todos os filmes participa Patricia Arquette. São eles Nicky, o Filho do Diabo, Estrada Perdida e Ed Wood.

10 de julho de 2009

CINEFILIA: As cinco promessas de Julho








SOBERBA. Ainda se sente que este é mês de Verão, até porque chegam às salas novos trabalhos de Van Damme e Steven Seagal, várias obras de terror menor e até as inevitáveis sequelas, que continuam sem abrandar o ritmo, como é o caso do novo capítulo de Harry Potter e a terceira parte de «A Idade do Gelo». Ainda assim, há apostas a reter.

- ELEGIA: Sabe-se que mais vale tarde do que nunca, mas a questão aqui é perceber por que tardou tanto este filme a chegar às salas nacionais. As razões do interesse é o ponto de partida, um célebre romance de Philip Roth, e o duelo de actores. Diz-se que Penélope Cruz nunca foi tão intensa e Ben Kingsley só precisa de ser o que tem sido até agora, a roçar a genialidade. A relação proibida entre professor e estudante promete ser ousada e psicologicamente estimulante.

- A IDADE DO GELO 3 - DESPERTAR DOS DINOSSAUROS: Condescendência às sequelas, até porque a animação do brasileiro Carlos Saldanha costuma resultar pelo tom descomprometido e mordaz. Espera-se que a fórmula surja reforçada até pela entrada em grande dos dinossáurios. E assim constrói mais um êxito...

- HOME - LAR DOCE LAR: A proposta mais arriscada do mês. Isabelle Huppert dá força a esta realização de Ursula Meier centrada numa auto-estrada abandonada e na casa isolada que ali fica perto. A vida de quem lá mora será ameaçada com a abertura da via à circulação de viaturas.

- BRÜNO: Fã de «Borat» e outras bizarrias de Sacha Baron Cohen, é com particular atenção que se quer assistir a esta nova figura, o estilista gay austríaco que vai causar estragos no mundo da moda. O talento para misturar realidade e ficção deve ser a mais-valia deste novo trabalho de Larry Charles. Rir de tudo isto não tem mal nenhum. E há poucas coisas que ainda nos fazem mesmo rir...

- SÉRAPHINE: Martin Provost filma com sensibilidade a vida da francesa Séraphine de Senlis, mulher nascida em 1864 que foi pastora e dona de casa antes de se transformar em pintora e submergir-se na loucura. É a proposta europeia, independente e séria do mês... Os críticos vão adorar.

6 de julho de 2009

NA SALA ESCURA: A nova era do jornalismo












AVAREZA. «Violámos a lei? - Não, a isto chama-se fazer grande reportagem.» Cal McAffrey (Russell Crowe)

Os tempos são outros e já há muito não se via uma tão interessante reflexão sobre o jornalismo e as suas causas. Quando a informação se encontra disseminada em blogues e as notícias disparam ao minuto, que espaço há para a grande reportagem?

No mundo real, este género jornalístico corre perigo de extinção, mas no cinema ainda dá azo a boas peripécias e preenche o propósito de mudar a ordem das coisas. Lembro-me disso ao ver LIGAÇÕES PERIGOSAS, boa adaptação de uma série televisiva britânica pela mão do mesmo realizador de «Touching the Void».

O que Kevin MacDonald alcança neste trabalho é a capacidade de construir um novelo narrativo sem ceder a lugares fáceis ou a mudanças de argumento que comprometam tudo o que foi construído antes. É certo que a fórmula já é conhecida: um crime misterioso, que envolve altas patentes, coloca um grande repórter no terreno. A verdade lá virá ao de cima, mas não se pense que tudo é previsível.

Neste ponto, há que olhar para o esforço de Russell Crowe em ser genuíno. O seu jornalista da velha guarda, Cal McAffrey, tem o faro apurado mas a incapacidade para ver com bons olhos jovens dinâmicos que dão resposta às necessidades da profissão de uma maneira que ele não consegue (nem quer conseguir por sentir que se está a desvirtuar a essência do jornalismo!). É uma personagem imperfeita, realista e com um «à vontade» desarmante.

O modo como Cal se envolve com as suas fontes também coloca em cima da mesa a necessidade de impor limites, mesmo que estes sejam flexíveis e, a espaços, ténues.

Além disso, LIGAÇÕES PERIGOSAS apresenta um cuidadoso punhado de personagens verosímeis e bem interpretadas. Seja a jovem jornalista de Rachel McAdams, a directora que pensa nas tiragens mais do que na isenção, vivida pela excelente Helen Mirren, o congressista dúbio de Ben Affleck ou o «todo-poderoso» de Jeff Daniels.

As cartas são lançadas com uma permanente noção de espectáculo e o filme nunca cede à monotonia. Mesmo quando a história dá uma viragem numa outra direcção, o espectador compreende à primeira a opção e deixa-se levar por uma narrativa que se quer tudo menos estática.

No final, e para lá de uma ou outra ponta mais mal cosida (e até de algum desapontamento face ao desenlace...), LIGAÇÕES PERIGOSAS cumpre os seus objectivos e faz pensar sobre o lugar do jornalismo nestes tempos de omnipresente ruído informativo.

Apesar disso, há uma estética retro neste trabalho que quer fazer crer que o protagonista vive em desadequação com o seu tempo.

Seja no velho carro que conduz ou no computador pesado em que trabalha, a figura do grande repórter de Russell Crowe é espessa e credível. O que torna ainda mais interessante a constatação de que o actor foi a segunda escolha. Tudo porque a ideia do filme era voltar a reunir a dupla Brad Pitt-Edward Norton depois de «Clube de Combate». Os dois nomes abandonaram a produção, mas, em troca, Crowe e Affleck dão bem conta do recado.

LIGAÇÕES PERIGOSAS
De Kevin MacDonald (2009)
* * *
Os que consideram que Russell Crowe é um canastrão sobrevalorizado vão ter de engolir em seco ao verem este interessante filme de suspense. Sim, ele está em grande e, em última instância, o que este trabalho nos quer mostrar é uma história dinâmica, um caso bicudo para resolver, um assassínio misterioso que mexe com altas esferas do poder. E consegue concretizar essa vontade com o fulgor que se pedia, óptimas personagens, diálogos secos e a destilarem ironia. Pode não ser revolucionário e muito inventivo, mas sabe as «linhas com que se cose». E nunca perde o seu tom de policial coeso por um momento. Mesmo que seja centrado no jornalismo, este trabalho pode não ser uma grande «cacha», mas é uma reportagem bem esgalhada.

4 de julho de 2009

OS MEUS POSTERS... Um Eléctrico Chamado Desejo








































INVEJA.
O tom de abismo moral entre as personagens de Marlon Brando e Vivien Leigh deve ser recordado como um dos momentos maiores do cinema. Recordo-me deste grandioso trabalho de Elia Kazan, que é também a melhor adaptação para cinema de uma peça de Tennessee Williams, porque a RTP 2 teve o bom gosto de o exibir esta noite. Além disso, é também uma singela (e redutora) homenagem a Karl Malden, esse eterno grandioso actor secundário, que faleceu no passado dia 1. Além do seu Harold Mitchell deste clássico, há que lembrá-lo em «Há Lodo no Cais», «All Fall Down» ou «Nevada Smith». Até sempre!

3 de julho de 2009

OS SETE PECADOS DE... Junho 2009

INVEJA. Junho foi mês de aniversário e de prendas de pendor cinéfilo. A mais impressionante foi um pack de DVD de Luis Buñuel, esse nome maior do cinema espanhol que levou para o ecrã histórias de forte carga dramática, ainda hoje capazes de impressionar. Amigo do surrealismo e com carreira feita a partir do México, o seu cinema prende o olhar. É o caso da sua versão de O MONTE DOS VENDAVAIS, uma adaptação que se quer muito fiel ao espírito literário da obra de Emily Brontë. Há um tom teatral em tudo, uma forma voraz de encarar os sentimentos e uma bela reconstituição de época.

SOBERBA. A Academia anunciou este mês que a próxima edição dos Óscares não vai contar com cinco nomeados para a estatueta dourada de Melhor Filme, mas com dez! Manobra comercial? Mais uma achega na desejada reforma para conquistar mais audiências? A justificação foi que a ideia é que a entrega de prémios regresse às suas origens, onde era norma ter uma dezena de candidatos ao mais ambicionado prémio. Consequência? As apostas tornam-se mais elevadas dado que, estatisticamente, será mais difícil de acertar à primeira. E desde «Crash», de Paul Haggis, que não há uma grande surpresa por aquelas bandas...

LUXÚRIA. Apesar de conhecer toda a carreira de Woody Allen, ainda existe um ou outro filme que me escapa. Se, recentemente, descobri o início dos inícios com «What's Up Tiger Lilly», caso de humor quase experimental e caótico, também em Junho me deparei com «Alice», deliciosa comédia sobrenatural, sobre uma mulher que está bem na vida mas infeliz. Para dar uma volta à sua existência e cometer o tão esperado adultério, a personagem de Mia Farrow decide consultar um especialista oriental em medicinas alternativas que lhe recomenda... umas ervas. É uma doce alucinação imperdível de Allen, um passo mais ligeiro na fase mais elevada da sua carreira.

IRA. Começa a cansar a moda das sequelas, prequelas e remakes do cinema. A estratégia dá certamente muitos frutos, mas fica-se com a ideia de que a sétima arte tem cada vez menos coisas novas. E o Verão é particularmente redutor neste ponto. Exemplos? «Wolverine», que é uma espécie de spin-off de «X-Men», «A Idade do Gelo 3», a nova vida para «Star Trek», «Exterminador Implacável: A Salvação» ou «À Noite no Museu 2». Socorro!

GULA. Já falta pouco para nos deliciarmos com a última produção da Pixar. «Up! - Altamente» parece que é uma delícia para os olhos, ainda mais com as potencialidades da técnica 3D.

PREGUIÇA. Estão cada vez mais monótonas e rotineiras as matinés de cinema dos canais em sinal aberto. Se não houvesse cabo e videoclubes, a oferta seria escandalosamente medíocre. Será que rende assim tanto usar sempre as mesmas fórmulas?

AVAREZA. As idas ao cinema têm sido escassas. Não é questão de poupança, é questão de falta de tempo... Espera-se que algo mude em breve.