25 de novembro de 2007

NA SALA ESCURA: Reminiscências dos Beatles







SOBERBA.
«Tens boa memória para caras? Ainda bem, é que não há espelho na casa-de-banho.» SADIE em Across the Universe
O musical vive dias de esquizofrenia: ou pura e simplesmente não conhece a luz do dia, ou copia os modelos clássicos sem a mínima chama. Depois, há uma terceira hipótese que, por exemplo, «Moulin Rouge» veio desbravar caminho: surgir como um produto alienígena, impregnado de referências, dinâmica de videoclipe, expressionismo gráfico e, em regra geral, uma história simples (até mesmo fraquinha...) a servir de ilustração para uma longa marcha de canções.

ACROSS THE UNIVERSE pertence a essa categoria: a dos musicais que querem rejuvenescer o género e imprimir-lhe alguma autenticidade nesta era de vertigem imagética
.

Qual é a via? A da abstracção sentimental, recorrendo a músicas que todos conhecemos. Neste caso, a ideia foi a de pegar em músicas dos Beatles para, daí, idealizar uma história. Sim, é bom reviver os singles que todos conhecemos, mas esta opção acaba por comprometer as ambições de ACROSS THE UNIVERSE em querer apresentar um argumento mais sólido do que a norma deste género.

A ideia de construir uma história a partir de músicas e não o inverso sabota pretensões mais elevadas e a obra apenas deve ser contemplada enquanto diversão naïve, instrumento para a realizadora dos mais interessantes «Titus» e «Frida», Julie Taymor, voltar a distorcer noções cénicas.

A cineasta bem se esforça por criar um trabalho pop, arty, impetuoso e com aura juvenil, mas a banda sonora volta a travar outros voos.

No fundo, um trabalho também ele esquizofrénico: quer recuperar as canções dos Beatles mas é quando está mais preso a elas que o filme mais fraqueja. Resta-nos o olhar inquieto da realizadora e as boas interpretações do casal juvenil Jim Sturgess e Evan Rachel Wood. Enfim, All We Need is Love...

ACROSS THE UNIVERSE
De Julie Taymor
* *

Já em «I Am Sam», a banda sonora era composta por temas dos Beatles, numa onda revivalista que funcionou porque eram grandes artistas - do calibre de Rufus Wainwright ou Ben Harper - a reviverem uma herança que ainda hoje está impregnada na memória. Neste caso, a ideia foi mais arrojada: criar uma história que justificasse que as personagens passassem a cantarolar cada uma das melodias da banda. O que se passa é que os recursos dramáticos utilizados são banais e desinteressantes, com a história a limitar-se a ser um romance passado numa época agitada e de algum esforço de contra-cultura. Resta-nos o empenho do casal principal e um punhado de boas ideias de abstracção narrativa de Julie Taymor. De resto, a monotonia instala-se. Ficam as intenções...

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