30 de maio de 2008

NA SALA ESCURA: Salteador depois dos 60







SOBERBA.
«Se querem ser bons arqueólogos... têm de sair da biblioteca.» INDIANA JONES (Harrison Ford)

O cinema está sem ideias. Ou melhor, sempre que se tem uma boa ideia há que multiplicá-la enquanto render. Todos os verões, cada vez mais as sequelas, os «remakes», as prequelas, as continuações não assumidas se multiplicam, quase sempre para deixarem um amargo de boca.

E até trilogias intocáveis são alvo de nova manipulação, tentando restituir o êxito de outrora. Devem ser poucos os que não sentiam saudades de Indiana Jones e consideram os três filmes originais como boas provas de que a aventura se pode inscrever no cinema sem que se comprometa a emoção, a inventividade.

Até porque «Os Salteadores da Arca Perdida» mostrou ao mundo que, se George Lucas e Steven Spielberg eram bons em separado, juntos tornavam-se imparáveis. O tempo passou... o cinema de massas parece preferir outro tipo de aventuras, mais amarradas ao poder do fantástico. Onde se insere a veterania de Indiana Jones neste novo paradigma?

Aproximando-se o mais que possível do mesmo estilo de sempre, preferindo voltar a testar os ponteiros do relógio, evitando os efeitos digitais exacerbados e insistindo nas acrobacias e nos socos como forma de passar obstáculos.

INDIANA JONES E A CAVEIRA DE CRISTAL é tudo aquilo que esperávamos do velho "Indy", com a sua sabedoria lacónica, o gosto pelas curtas palavras, a vontade em salvar o dia
depois de muitas peripécias.

Um filme de Indiana Jones continua a ser uma montanha-russa e Spielberg fez a justa homenagem ao seu herói, mostrando que os cabelos brancos, as rugas e o ar pesado só dão mais sabedoria a uma boa jornada.

Neste tempo de regresso de velhos heróis - sim, Rambo, Rocky, Batman e Super-Homem já voltaram sem pedir licença -, o arqueólogo mais famoso soube actualizar-se, mantendo-se preso ao seu tempo. Não pedíamos mais.

INDIANA JONES E A CAVEIRA DE CRISTAL
De Steven Spielberg (2008)
* * *
O chapéu, o chicote. Haverá Indiana Jones para lá disso? E que hipótese existe para o herói mais humano de todos neste século XXI? Toda, porque os protagonistas de hoje quase sempre parecem descolados da esfera sensível. Não queremos rostos divinizados, mas referências que ajam, se assustem, ironizem e sejam conservadoras à sua maneira. Além de ser o melhor desempenho de Harrison Ford dos últimos 10 anos, este novo filme é um regresso de Spielberg ao seu universo fantástico, genuinamente juvenil, que ainda lhe assenta como uma luva. Sim, há personagens presas a caricaturas (como a de Cate Blanchett), outras algo subaproveitadas (como a da bem regressada Karen Allen), há uma história tão excêntrica que chega a ter graça, e pouca vontade em inovar. Mas também não era isso que queríamos. A vontade era apenas comprovar como Indy se voltaria a safar de mais uma missão. Resultado? Prova superada.

28 de maio de 2008

OS MEUS POSTERS: As Brancas Montanhas da Morte

























GULA.
É o branco que domina a paisagem, numa jornada atribulada e lacónica com Robert Redford a liderar o caminho e a escapar-se da civilização. AS BRANCAS MONTANHAS DA MORTE é o western possível nos anos 70 (ou a sua antítese), com o dom de se transcender. Estes é um dos pontos mais altos da caminhada de Pollack!

Sydney Pollack era a evolução de Hollywood







INVEJA.
«Não avalio o valor de um filme pelo prazer que tenho em dirigi-lo. Se ele é bom, é porque deu mesmo muito trabalho.» SYDNEY POLLACK

Começou a dirigir no final dos anos 60, discretamente. Foi, a par com Scorsese ou Coppola, um dos cineastas rebeldes dos anos 70 e colocou Hollywood a seus pés na década seguinte.

Menos ambicioso, Sydney Pollack passou os anos 90 a revisitar géneros e a aperfeiçoar o cinema político, que culminou na sua última longa-metragem «A Intérprete», filmada na sede das Nações Unidas.

Morreu no início da semana (dia 26 de Maio), vítima de doença prolongada, e com ele perdeu-se mais um pedaço de Hollywood.


Sim, porque Pollack era um realizador que não pretendia mudar os cânones da indústria, apenas aperfeiçoá-los e dar-lhes o seu cunho. Até porque a ousadia, a reverência aos seus mestres, as convicções e o gosto pelo cinema comercial estiveram lá sempre, bem como as «perninhas» na representação, em obras de Woody Allen ou Stanley Kubrick.

O que nos deixa, Sydney Pollack? Uma boa lição de história de cinema, das últimas quatro décadas, até porque os seus trabalhos souberam como poucos incorporar o estilo e o tom do cinema no seu tempo. Tal como em «As Brancas Montanhas da Morte» ajudou a «enterrar» o western clássico, em «Os Três Dias de Condor» analisou o clima de paranóia do cinema político. Já com «Tootsie» espelhou uma certa abertura sexual e aperfeiçoou a sátira, com «África Minha» mostrou como se faz um clássico romântico do mais alto calibre (ganhou dois Óscares por isso, incluindo o de Melhor Realizador).

Em «Sabrina» rendeu-se aos remakes (optando por ir ao património de Billy Wilder buscar inspiração) e, com a «Intérprete», mostra como os dias de hoje são, a nível planetário, muito movediços.

O que mais lhe podemos pedir? A imortalidade. Depois das mortes de Ingmar Bergman e Antonioni no ano passado, esta é a de maior peso de 2008. Mais um sinal de que o mundo real continua, no seu ritmo inexorável. Ficam os filmes, a suspenderem o tempo.

24 de maio de 2008

O MAIOR PECADO DE... Harrison Ford







PREGUIÇA.
«Os seus movimentos parecem particularmente cansados.» TIME OUT

Já o vimos à procura da mulher em Paris, a fugir para provar que não tinha morto a mulher, a lutar com criminosos sendo ele o Presidente dos Estados Unidos, a infiltrar-se numa comunidade amish para salvar uma criança. Já o vimos como arqueólogo, médico, polícia.

Em FIREWALL, o modesto e muito fraco thriller de 2006, vemos apenas Harrison Ford a tentar copiar as fugas de outrora, num caso sério de um filme de grande orçamento que quer apenas copiar os modelos que Ford conseguiu impor como êxito no passado
.

É certo que a carreira deste actor (outrora carpinteiro de estrelas de cinema) já está impressa num lugar generoso das memórias de Hollywood, ou não fosse, a par de Will Smith ou Tom Cruise, a estrela que mais êxitos de bilheteira acumulou no currículo.

Não esquecer que, além da saga de Indiana Jones, Ford esteve presente na trilogia original de «A Guerra das Estrelas», no clássico de culto Blade Runner e em vários thrillers dinâmicos, memoráveis, como Frenético, O Fugitivo ou A Testemunha. Mas os anos começam a pesar, sendo que, com excepção da recente estreia do quarto capítulo de Indiana Jones, os filmes mais recentes de Harrison Ford são facilmente esquecíveis.

Particularmente este, que não tem uma única ideia arrojada e conta com um vilão tão caricatural que soa a falso e um próprio Ford com ar exausto, quase a arrastar-se até ao fim, já sem forças para concluir uma missão que não prende minimamente o espectador.

E que missão é esta? Desta vez na pele de um especialista de segurança de computadores, Ford trabalha num banco e só ele pode abrir os seus cofres, recorrendo a uma complexa rede de códigos de acesso e firewalls. Sim, ele torna-se alvo fácil para um criminoso que só quer o que todos querem, fortuna, e que por isso está condenado desde o início.

A família do protagonista está em risco, mas nem Virginia Madsen, na pele da mulher do protagonista, consegue ser convincente. O que fica no final? Muito orçamento desperdiçado, nenhuma chama e a conclusão de que Ford está velho para este tipo de dilemas. Será que rejuvenesceu em Indiana Jones?


Críticas de Fugir:
- TIME: Já se viu este filme dúzias de vezes.

- JOURNAL AND COURRIER: «Firewall» não oferece nada de novo e original.
- CINEMA EM CENA: O argumento atravessa a fronteira do ridículo no terceiro acto.
- CHRISTIANITY TODAY: Há um ar de desespero em «Firewall», uma percepção de que Ford precisava de fazer este filme apenas para manter o seu rosto sob o olhar do público.
- NEW YORK POST: Esteja à espera de uma série previsível de duplos sentidos, tentativas de fuga que serão assustadoramente familiares para alguém que tenha visto o recente «Reféns».

23 de maio de 2008

QUIZ: Estes elementos lembram que filme?








Mais um desafio, desta vez mais acessível. Toca a apelar às memórias cinéfilas para o descortinar. A resposta está mesmo aí...
Solução do QUIZ anterior: «O Código Da Vinci», de Ron Howard.

Ainda há cinema em Cannes?







SOBERBA.
«Tenho a filosofia de que o dinheiro fala e a fortuna grita.» SHARON STONE

Vemos Harrison Ford a querer parecer mais novo do que é ao lado de uma reluzente Cate Blanchett; vemos o casal Jolie e Pitt a quererem parecer mais felizes do que são; vemos Woody Allen e Penélope Cruz a parecerem mais tímidos do que são; vemos Sharon Stone e Madonna a quererem passar por amigas íntimas.

E... onde está o cinema? Para quem anda distraído, o Festival de Cannes começou há mais de uma semana mas, até ao momento, o que tem passado para fora é uma imensa passadeira de vaidades, onde quem mais lucra devem ser estilistas de renome do que os produtores dos filmes em que as referidas estrelas participam.

O certame teve o pontapé de saída com «Blindness», a aguardada obra de Fernando Meirelles, feita a partir de «Ensaio Sobre a Cegueira». No entanto, ninguém pareceu interessado em discutir o valor artístico da obra (ao que parece, foram mais as vozes críticas do que os aplausos), até porque no dia seguinte já estava tudo com os olhos postos em Harrison Ford e companhia, com o regresso de Indiana Jones.

Também aqui se falou pouco do mérito deste novo encontro entre Spielberg e Lucas, já que no horizonte se vislumbrava já a silhueta redonda de Jolie, novamente na figura de par perfeito com Brad Pitt. E assim sucessivamente... Parece que, cada vez mais, o cinema é uma manobra de marketing, feita de rostos. Ninguém está preocupado em analisar a recepção de um filme, perceber o que está por trás de cada projecto, quer apenas ver caras, medir tamanhos e pesos, analisar penteados e procurar rugas.

Pensamos que é isso que faz Hollywood, mas cada vez mais é também o que está por detrás da máquina de Cannes. Sim, é o maior festival de cinema do mundo. Sim, é por lá que passam os melhores filmes. Sim, é o certame que melhor conjuga cinema comercial com autoral. Sim, merece atenção. Mas daí a tornar-se numa espécie de Museu de Cera em movimento vai um longo passo. Não é esta a sua essência.

E, em última análise, deve-se culpar mais os media do que o próprio evento por aquilo que passa para o exterior. Ainda há cinema em Cannes? Sim. Há é falta dele na forma de comunicar.

16 de maio de 2008

OS MEUS POSTERS: O Escafandro e a Borboleta

























GULA.
Se em «21 Gramas» se dissertava que este era o peso da alma, em O ESCAFANDRO E A BORBOLETA a vida e a capacidade de expressão pode estar apenas numa piscadela de olho. Extraordinário drama humano, este belo filme de Julian Schnabel (absolutamente obrigatório) é igualmente um prodigioso trabalho de realização.

NA SALA ESCURA: Tentar casar com a comédia








PREGUIÇA.
«Parece que descobri que a minha canção de amor favorita foi escrita por uma sanduíche.» JANE (Katherine Heigl)

Quem vive a dois sabe que é preciso ceder, de vez em quando. Em tudo, até nas escolhas cinéfilas, sob pena de acabar por ir ao cinema sempre sozinho.

Torci o nariz, quando soube que a escolha para aquele serão de sexta-feira era VESTIDA PARA CASAR
.

Mas engoli em seco e tentei mostrar que não cedo facilmente a preconceitos. A culpa da escolha? A protagonista Katherine Heigl, que ficou conhecida na série «Anatomia de Grey» e que até se portou bastante bem em «Um Azar do Caraças» (quem deu o título ao filme em português é que se portou mal...).

Pois bem, lá fomos e o que é certo é que não custou assim tanto. Sim, o filme segue passo a passo a lógica da comédia romântica convencional, não ousa por um instante sequer e é bastante ligeiro na forma como descreve as personagens. A nível técnico, nada de pertinente a assinalar.

No fundo, fui ao cinema à sexta-feira à noite como se de uma tarde de domingo caseira se tratasse - é este o tipo de filme que abunda nas matinés dos nossos canais generalistas. A boa notícia é que a próxima ida ao cinema será escolhida por mim. Alguém tem que ceder...

VESTIDA PARA CASAR
De Anne Fletcher (2008)
* *
Uma jovem tem tanto jeito para organizar casamentos que até se esquece da sua vida pessoal. Onde é que já vimos isto? Bem melhor do que, por exemplo, «Resistir-lhe é Impossível», esta comédia ligeira faz-nos ter saudades do tempo em que Harry conheceu Sally em «Um Amor Inevitável». Porque é que as comédias românticas são cada vez mais parecidas umas com as outras? Esta pelo menos tem o mérito de descomplexadamente assumir ao que vem e de contar com a frescura de Katherine Heigl para sustentar uma história pouco envolvente. O resultado sabe a pouco, mas é honesto na forma como se apresenta. O que parece é que é cada vez mais difícil casar a comédia com o arrojo.

15 de maio de 2008

CINEFILIA: As cinco promessas de Maio







SOBERBA. O mês de Maio é pautado por uma característica incómoda: o excesso de estreias - só nesta quinta-feira, dia 15, chegam às salas de cinema oito novos filmes (!). No meio desta imensidão, vai uma ajuda?

- INDIANA JONES E O REINO DA CAVEIRA DE CRISTAL: A razão para estar na lista é só uma - é talvez a estreia mais aguardada dos últimos anos. Ou melhor são duas: adoramos desde sempre o arqueólogo. Como será que ele lida com o peso da idade? Como será a nova reunião dos talentos Spielberg/Lucas? Como será Cate Blanchett a fazer de vilã? Como será que se actualiza uma saga digna dos anos 80 em pleno século XXI? Chega de perguntas?

- ANGEL - ENCANTO E SEDUÇÃO: Inglaterra, 1905. Uma jovem escritora quer ser bem sucedida, famosa, respeitada e encontrar o amor. É difícil ter tudo de uma só vez... que o diga o cineasta francês François Ozon, hábil gestor de emoções.

- LARS E O VERDADEIRO AMOR: Depois de «O Sabor da Cereja» ter sido pouco respeitado pela crítica, este pequeno filme arrisca-se a ser a mais sólida comédia-romântica-de-aura-independente-do-mês. Tudo porque um jovem introvertido (o respeitável Ryan Gosling) apaixona-se por uma boneca em tamanho real, julgando que ela é real. Estamos todos loucos? Ou só a precisar de atenção?

- GOODNIGHT IRENE: Filme urbano português nem sempre traz bons resultados. E que tal arriscar neste? Sobre dois homens de hábitos excêntricos que decidem unir-se atrás de uma obsessão, a mulher que dá nome a este trabalho dirigido por Paolo Marinou-Blanco.

- SHINE A LIGHT: Quem duvida que Rolling Stones e Martin Scorsese não têm nada a ver, é porque anda há mais de 30 anos muito distraído. Agora que a rebeldia veterana de uns se junta ao talento cinematográfico de outro, é altura de aplaudir a música aguerrida de uma banda que já está na história. É bom quando o cinema tropeça na música. E quando a obra é bem dirigida, tanto melhor.

13 de maio de 2008

Do céu caiu uma estrela há cem anos







INVEJA.
«Sou James Stewart a fazer de James Stewart. Não podia falhar com as minhas caracterizações. Interpreto variações de mim mesmo.» JAMES STEWART

Acreditava que o público era o seu maior crítico e se este não correspondesse a um desempenho seu, ele mesmo o desdenhava. Sobre o seu estilo, para o qual nunca contribuiu nenhum curso de arte dramática, dizia que não reflectia uma actuação, mas sim uma reacção.

Então, qual o motivo para a reverência em torno de uma das mais sólidas carreiras de Hollywood, ainda hoje admiradas em igual dose tanto nos melodramas românticos e nas intrigas de suspense como nas jornadas maiores do que a vida, que definem as aventuras do Velho Oeste?

James Stewart é o mais clássico dos galãs, de ar aprumado, cordial no trato e no modo de falar que, acima de tudo, ajudou a mostrar que existe humanidade no cinema
.

Quando se comemoram cem anos do seu nascimento (mais precisamente a 20 de Maio em Indiana, na Pensilvânia), é altura de rever uma carreira que surgiu já depois de um curso de arquitectura e muito trabalho nos palcos da Broadway durante a década de 30. De seu nome completo, James Mia Maitland Stewart, acabaria por chegar discretamente ao cinema por via de um filme negro, Murder Man. Estava dado o mote para uma coesa carreira, definitivamente marcada por três géneros, talvez os mais importantes no horizonte criativo do grande ecrã.

Pela mão de Frank Capra explorou como poucos o melodrama sensível, tornando-se lendários os seus desempenhos em Do Céu Caiu uma Estrela ou Peço a Palavra. Já com Alfred Hitchcock conheceu todos os ingredientes do thriller psicológico, seja a testemunhar crimes preso a uma cadeira de rodas em Janela Indiscreta ou à procura do filho numa sinuosa Marraquexe em O Homem Que Sabia Demais.

Por fim, com Anthony Mann, deu vida a heróis sofridos que dão o tudo por tudo em nome da justiça, em obras memoráveis como A História de Glenn Miller ou O Homem Que Veio de Longe. Pelo meio, e com a elegância de sempre, veio a comédia romântica e o Óscar de Melhor Actor em Casamento Escandaloso, além de outras colaborações com cineastas do calibre de John Ford, Billy Wilder, Robert Aldrich ou Otto Preminger.

O que é certo é que James Stewart deixou a sua marca de «homem simples» dentro e fora do ecrã, desviando-se das polémicas, evitando falar sobre a sua participação na guerra, casando-se uma só vez. A imagem que fica quando se celebra este justo centenário? A de um homem de valor, que insistiu em usar sempre o mesmo chapéu nos muitos westerns que protagonizou...

9 de maio de 2008

O QUE AÍ VEM... I'm a Cyborg But That's OK

INVEJA. «Não gosto de ver filmes que evoquem a passividade. Se se precisa desse tipo de conforto, não percebo porque é que não se vai a um spa.» CHAN-WOOK PARK

Quem não ficou vidrado com o extremismo emocional de «Oldboy» levante o braço. Parece ter sido o registo encontrado pelo sul-coreano Chan-Wook Park para mostrar o seu cinema, ao ponto de construir uma das mais ousadas trilogias, logicamente centrada no tema da violência e da vingança.

Alguém o imagina a fazer uma comédia romântica surrealista? A primeira parte nem tanto, mas a componente surreal só podia lá estar... É o que parece ter feito com I'M A CYBORG BUT THAT'S OK, ou melhor, esta é a forma que encontrou para mostrar que até é um sentimentalão...

Será que os robôs também amam? E aqueles que o julgam ser? Nesta fantasia bizarra, muito cuidada graficamente parece que a psicologia é um lugar estranho.


Trata-se de uma obra mais suave do que as suas dispersões anteriores, mas parece que consegue ser igualmente extrema no modo como narra a jornada de uma mulher que julga ser um cyborg e que, por isso, vai parar a um asilo.

Nesse espaço impessoal imagina armas, máquinas, confrontos impossíveis e... apaixona-se. Será ela a louca ou a única sã? Quem não parece muito normal é mesmo Chan-Wook Park. Ainda bem.

QUIZ: Estes elementos lembram que filme?








As respostas ao desafio anterior foram imediatas, sinal de que tenho de ir aperfeiçoando a técnica e tornar os desafios mais complexos. Será que consegui neste caso?

Solução do QUIZ anterior: «Os Pássaros», de Alfred Hitchcock

Crime, dizem elas








SOBERBA.
«Não existe amor feliz.» MAMY (Danielle Darieux)

No outro dia revi este filme, que é um importante tratado cinematográfico, não só em matéria de estrutura, mas também na homenagem que faz ao cinema francês e às suas actrizes.

Oito mulheres, oito «egos» que se confrontam num jogo de mentiras e de verdades dúbias. Cada uma com o seu telhado de vidro, mas também com o seu charme, o seu perfume.


A acção, em jeito de opereta, desenrola-se em plena década de 50, numa casa de campo isolada, num dia de neve natalícia, onde oito mulheres elegantes se questionam sobre a autoria da punhalada que matou o patriarca e único macho da casa. Todas elas tinham contas a ajustar com o chefe de família e, deste modo, todas são suspeitas. Como qualquer bom filme policial, o argumento deste é armadilhado. Há sempre revelações estrondosas e um desfecho singular.

Na verdade, enquanto obra de suspense, OITO MULHERES é até bastante linear, com uma estrutura idêntica às boas histórias de Agatha Christie. François Ozon parece usar a história como motivo secundário para fazer brilhar oito das mais carismáticas actrizes francesas: Catherine Deneuve (a esposa do falecido), Fanny Ardant (a irmã misteriosa), Isabelle Huppert (a cunhada), Virginie Ledoyen (a filha mais velha), Emmanuelle Béart (a empregada), Danielle Darrieux (a sogra), Firmine Richard (a governanta) e Ludivigne Sagnier (a filha mais nova).

Aqui há uma lógica entre causas e efeitos: cada uma das personagens transporta em si as consequências dos seus actos passados, o que vai estar na base dos conflitos que vão crescendo entre elas até ao clímax e ao posterior desenlace.

Depois das premissas iniciais, o clima adensa-se. Há novos factos que confundem o espectador e que constituem pistas ou obstáculos para se chegar a uma verdade, ou melhor, à verdade do filme: quem matou o chefe da casa? Descobre-se que afinal a empregada tinha um romance com o patrão, a sogra devia-lhe dinheiro de acções, a esposa contava sair de casa por não suportar mais a relação, a filha mais velha afinal não é filha dele e a governanta tem um caso com a misteriosa irmã da vítima. Tudo é revelado de rajada num exercício de comprometimentos irrevogáveis.

No fim, todas acabam por ser responsáveis e a emoção e a surpresa acabam por regressar quando algo, que é preferível não contar, acontece.

Pode dizer-se que é a pedra de toque para uma história feminina, em que cada mulher se exibe como se figurassem em quadros. Sobretudo, quando interpretam, à vez, números musicais que adocicam o filme e o tornam mais sensível e leve.

No fundo, 8 MULHERES é um exercício de estilo, de puro prazer, que assume uma teatralidade que joga a seu favor, gerando uma ligeira sensação de que se está a assistir a uma peça de teatro e não tanto a um filme.

Porém, se essa teatralidade justifica a explosão cromática e o cenário limitado de uma casa (para salientar o efeito de clausura), já os números musicais, as maquilhagens e os vestidos esvaziam um pouco a história da sua profundidade e inserem todo o ambiente no campo da caricatura e dos exageros de personalidade.

Na verdade, cada actriz representa uma «personagem-tipo», mas não deixa de ser interessante observar o confronto lascivo entre elas.

Na sessão de apresentação desta sua quinta longa-metragem, o realizador François Ozon admitiu: «Pensei em fazer este filme para o meu próprio prazer. É verdade que tive o casting ideal. Tive todas as actrizes que quis.»

Definitivamente, neste mundo, os homens não têm espaço. Elas armam a tenda: falam, cantam, dançam, discutem, choram, riem, vivem. Chegou-se a dizer que este filme tratava de pegar nas maiores actrizes de cada geração (faltam cá só Jeanne Moreau, Juliette Binoche, Sophie Marceau ou Julie Delpy) e de confrontá-las como animais ferozes de circo.

É um pouco isso. Mas é também muito mais: trata-se de regressar ao imaginário feminino de Vincente Minelli, George Cukor ou mesmo Woody Allen e recriar uma atmosfera esteticamente bela e preenchida por um glamour irresistível.

7 de maio de 2008

OS SETE PECADOS DE... Abril 2008







LUXÚRIA.
No mês em que me fiz sócio de um videoclube da vizinhança, aproveitei para redescobrir um par de obras do cinema comercial recente que estava em falta. O jogo de luxúria de BEOWULF foi uma agradável surpresa, ainda que a tecnologia digital não esteja suficientemente apurada. Ou melhor, no filme vê-se que foram usados os mais modernos métodos, mas ainda não chega para que a fluidez se sobreponha ao artificialismo. Resta uma boa história, uma interessante noção medieval de aventura e a pena de não ter visto a versão tridimensional que chegou aos cinemas.

AVAREZA. Descobri que alugando filmes poupo dinheiro e isso fez com que reduzisse consideravelmente as aquisições do mês de Maio. Mantenho-me, contudo, fiel à colecção de cinema do jornal «Público» e à de clássicos de «western».

IRA. Por falar em descobertas no Velho Oeste, este mês de Maio trouxe uma boa surpresa: descobri «O Comboio das Três às Dez», excelente jogo de personagens entre Glenn Ford e Van Heflin, um mau e outro bom, quando no fundo são apenas dois homens em lados opostos da Lei. Ao que parece, o original é bem melhor do que a versão revisionista com Christian Bale e Russell Crowe que estreou há uns meses. Há uma ambiguidade moral e um bom sentido de suspense que tornam a obra numa interessante jornada a preto e branco.

GULA. Apesar de ter reduzido nas revistas de cinema, não resisti à edição deste mês da britânica «Empire», que além de dar a capa ao novo capítulo de Indiana Jones, ainda traz uma revista extra onde revê tudo o que gira em torno do célebre aventureiro que está mesmo quase a regressar aos ecrãs.

PREGUIÇA. A vontade de ir ao cinema continua em alta, a concretização é que nem por isso... Sou cada vez mais um cinéfilo de sofá, há algum mal nisso? Os puristas dirão que sim, mas nunca descobri tanto cinema como agora. Mesmo que mais afastado da calendarização das estreias na sala escura.

SOBERBA. Impecável, o trabalho que Robert De Niro fez em «O Bom Pastor». Outra das grandes descobertas do mês. Matt Damon é um extraordinário actor e personifica de forma surpreendente a dualidade de quem vive na sombra. A espionagem ainda consegue suspender o olhar.

INVEJA. De mansinho, o IndieLisboa continua a confirmar que é um dos mais sólidos eventos da vida cinematográfica nacional. A edição de 2008 parece que correu sobre rodas. Venham mais cinco!

5 de maio de 2008

OS MEUS POSTERS: Mean Streets


























IRA.
Quando se descobre um grande filme e se desfaz uma gigantesca falha no currículo de visionamentos, a satisfação reina. Foi o que senti ao perceber de onde vem o sentido de ebulição de Martin Scorsese. MEAN STREETS - CAVALEIROS DO ASFALTO é um óptimo ponto de partida para se entender que o seu cinema vem mais da emoção do que da intriga.