23 de maio de 2008

Ainda há cinema em Cannes?







SOBERBA.
«Tenho a filosofia de que o dinheiro fala e a fortuna grita.» SHARON STONE

Vemos Harrison Ford a querer parecer mais novo do que é ao lado de uma reluzente Cate Blanchett; vemos o casal Jolie e Pitt a quererem parecer mais felizes do que são; vemos Woody Allen e Penélope Cruz a parecerem mais tímidos do que são; vemos Sharon Stone e Madonna a quererem passar por amigas íntimas.

E... onde está o cinema? Para quem anda distraído, o Festival de Cannes começou há mais de uma semana mas, até ao momento, o que tem passado para fora é uma imensa passadeira de vaidades, onde quem mais lucra devem ser estilistas de renome do que os produtores dos filmes em que as referidas estrelas participam.

O certame teve o pontapé de saída com «Blindness», a aguardada obra de Fernando Meirelles, feita a partir de «Ensaio Sobre a Cegueira». No entanto, ninguém pareceu interessado em discutir o valor artístico da obra (ao que parece, foram mais as vozes críticas do que os aplausos), até porque no dia seguinte já estava tudo com os olhos postos em Harrison Ford e companhia, com o regresso de Indiana Jones.

Também aqui se falou pouco do mérito deste novo encontro entre Spielberg e Lucas, já que no horizonte se vislumbrava já a silhueta redonda de Jolie, novamente na figura de par perfeito com Brad Pitt. E assim sucessivamente... Parece que, cada vez mais, o cinema é uma manobra de marketing, feita de rostos. Ninguém está preocupado em analisar a recepção de um filme, perceber o que está por trás de cada projecto, quer apenas ver caras, medir tamanhos e pesos, analisar penteados e procurar rugas.

Pensamos que é isso que faz Hollywood, mas cada vez mais é também o que está por detrás da máquina de Cannes. Sim, é o maior festival de cinema do mundo. Sim, é por lá que passam os melhores filmes. Sim, é o certame que melhor conjuga cinema comercial com autoral. Sim, merece atenção. Mas daí a tornar-se numa espécie de Museu de Cera em movimento vai um longo passo. Não é esta a sua essência.

E, em última análise, deve-se culpar mais os media do que o próprio evento por aquilo que passa para o exterior. Ainda há cinema em Cannes? Sim. Há é falta dele na forma de comunicar.

1 comentário:

emot disse...

Isto é uma velha questão. Cannes é um festival muito mediatizado não só porque une, como poucos, o cinema autoral com o comercial, mas porque sabe criar espectáculo (onde tem uma longa tradição), sessões de fotos originais e cativar as estrelas certas. E isso fá-lo apetecível para todos os meios. Infelizmente são cada vez mais os jornais/revistas interessados no glamour e no que as estrelas fizeram por lá do que nos filmes que estreiam.