19 de abril de 2010

NA SALA ESCURA: Dois estilos animados

GULA. «Tudo o que sabemos a vosso respeito está errado.» HICCUP em Como Treinares o Teu Dragão

Já em diversas ocasiões reflecti sobre o estado da animação. Nunca esteve tão forte, imaginativa e tecnologicamente avançada. COMO TREINARES O TEU DRAGÃO, da Dreamworks, e A PRINCESA E O SAPO, da Disney, comprovam-no, ainda que o façam de formas diferentes.

Um sinal de que a indústria tem músculo para inventar, testar novas regras, mesmo que nestes dois casos vá buscar inspiração a modelos por diversas vezes testados, divertindo-se a invertê-los ou, simplesmente, a convocá-los.

O que têm em comum estas duas propostas? Foram êxitos consideráveis nas bilheteiras e são dois bons exemplos de que é possível encontrar um equilíbrio entre técnica e gestão dramática.

No caso de A PRINCESA E O SAPO, que se estreou no início do ano, o prodígio de revitalizar a animação clássica da Disney, optando pelo traço em vez do píxel, é de aplaudir, até porque o filme convoca grande parte do património animado dos estúdios, ainda num tempo pré-Pixar.

A história da princesa que é negra, sonhadora, pouco interessada em futilidades femininas, trabalhadora e modesta, representa também algum arrojo na construção das personagens que é digno de nota. Se não, veja-se: o príncipe é autoritário, preguiçoso e mulherengo em grande parte da acção; a princesa loura e vaidosa, é mimada até ao tutano e insuportável de aturar; os parceiros do par protagonista são animais pouco convencionais - um crocodilo trompetista e um pirilampo desdentado; além disso, os números musicais bebem muito mais do versátil jazz de Nova Orleães do que propriamente de baladas xaroposas.

Tudo excelentes opções, reflexo de uma produção que se quis actualizar sem, contudo, desdenhar das raízes da Disney.

Já COMO TREINARES O TEU DRAGÃO comprova que a Dreamworks continua a fazer sombra à Disney, para lá da saga 'Shrek'. Depois de uma série de tentativas mais divertidas do que profundas, consegue-se aqui também animar os adultos, tal como as crianças.

Esta viagem pelo tempo dos vikings não tem tempos mortos e inverte o imaginário do dragão assustador, cuspidor de fogo. A fábula é carregada de boas intenções, mas tudo é exposto na altura certa, dando espaço às personagens para se desenvolverem.

O 3D utilizado mostra que a técnica está-se a impor com uma rapidez impressionante. Ainda assim, COMO TREINARES O TEU DRAGÃO tira partido dela sem se centrar nela. É um filme que vale por si, com muitos mais méritos do que fraquezas.

Em suma: a animação está bem e recomenda-se. Para gáudio do público e dos bolsos dos produtores de cinema.

COMO TREINARES O TEU DRAGÃO
De Dean DeBlois e Chris Sanders (2010)
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O imaginário dos vikings foi uma ideia de génio para articular tudo com as criaturas aladas que, à primeira vista, são ameaçadoras, mas que escondem muitos segredos, que um jovem desarticulado com a sua comunidade vai aprender a respeitar. Além de uma óptima animação 3D, este delicioso filme comprova que a Dreamworks consegue quase alcançar o nível máximo dos estúdios Pixar. É caloroso e muito divertido. Está a arrasar as bilheteiras de todo o mundo! Por isso, não deve tardar a sequela...

A PRINCESA E O SAPO
De Ron Clements e John Musker (2009)
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Quem viu 'O Rei Leão', 'A Pequena Sereia' ou 'A Bela e o Monstro' consegue matar saudadas com este conto de fadas com mais reviravoltas do que é suposto. Divertido e bem construído, este filme tem aura de clássico, embora a sua dinâmica seja moderna. Com óptima animação e música de Nova Orleães, A PRINCESA E O SAPO é um caso raro de bom gosto. Que deve ser desfrutado em família. Foi nomeado para três Óscares - Melhor Filme de Animação e Melhor Canção Original, com os temas 'Almost There' e 'Down in New Orleans'.

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