1 de agosto de 2006

Manual anti-neura em forma de disco

Há dias assim... Em que as coisas não batem certo, o ânimo vai abaixo e aparecem sempre umas contas extra - seja um imposto desconhecido, uma avaria no carro ou um ordenado que tem de esticar. Estive assim ontem. E hoje, apesar de estar em recuperação, tenho sempre um remédio mais eficaz que qualquer placebo. Trata-se de uma comédia musical, com dúvidas existenciais "à la Adrian Mole", que nos ajuda a perceber que há mais gente que passa por dias em que parece que não devia ter saído da cama. Alta Fidelidade, do irrepreensível Stephen Frears, é o manual anti-neura perfeito, por articular as questões do amadurecimento (ainda que, primordialmente, a nível afectivo) com uma poderosa banda-sonora a culminar com uma versão deliciosa de Jack Black do clássico "Let's Get It On" de Marvin Gaye. Pelo menos, durante cerca de hora e meia, os dilemas de Rob Gordon (impecável John Cusack) sobrepõem-se com leveza às nossas interrogações existenciais (que, a longo prazo, se revelam pequenas e uma mera agulha num gigantesco palheiro). E nos fazem acreditar nas potencialidades do cinema enquanto fonte genuína de entretenimento. Além dos olhos, estimulam-se também os ouvidos. Um sinal claro de puro bom gosto.

Pecado do Dia: Soberba

O realizador Stephen Frears, que esteve no ano passado a dar uma lição de cinema na Gulbenkian (e onde, justamente, foi exibido este filme), gosta de experimentar todos os géneros cinematográficos, parecendo, em cada um deles, um mestre de subtilezas e ciente de uma noção profunda de estilo. No âmbito da comédia ligeira, Frears nunca tinha dado grandes pistas, mas, com Alta Fidelidade, prova conhecer todos os segredos do género e cria uma profunda e respeitadora adaptação da obra de Nick Hornby. Tudo está no sítio certo e, a espaços, John Cusack fala para a câmara à semelhança de Ally McBeal, porque esta comédia é mais televisiva do que outra coisa. Ainda assim, o entusiasmo digno de "sitcom" de culto que provoca é delicioso e Alta Fidelidade é o filme pós-adolescente mais ligeiro e mais "cool" de se adorar de todos os tempos. Está tudo lá: os vícios, os defeitos, os hobbies, os encontrões com o coração, as mulheres, o desejo de fazer listagens de tudo e mais alguma coisa e... a música. Que reflecte um bom gosto sem mácula. Depois... depois há Jack Black em início de carreira num dos desempenhos secundários mais divertidos de todos os tempos. Basta ver a sua entrada em cena na loja de discos onde trabalha. Dá para esquecer? * * * *

2 comentários:

gonn1000 disse...

Curioso, revi este filme ontem no canal Hollywood lol
Concordo, é inteligente, leve e divertido, combinação difícil de encontrar, mas mesmo assim prefiro o livro.
Gostei do blog :)

emot disse...

Eu sou mesmo grande fã do filme - não li o livro. Aliás, foi aí que "descobri" Jack Black. Tem óptimos desempenhos, bem sentidos, parece.