4 de abril de 2007

NA SALA ESCURA: Bean parece-se mais com Tati

AVAREZA. «França. Uma terra de cultura, beleza e paz. Sempre foi o lugar perfeito para tirar umas férias. Até agora...» No momento em que o narrador do trailer desta segunda aventura cinematográfica da célebre personagem Mr. Bean termina a frase, o curioso esgar desta figura que se confunde já com a pele de Rowan Atkinson vê-se ao longe, com «o homem que toda a gente queria ter como vizinho do lado» a sair de um comboio com aquele ar que combina ingenuidade e queda natural (mesmo que, por vezes, algo forçada) para o disparate. Sabe bem este regresso ao melhor humor físico, mas Atkinson, que deve não querer esgotar por exaustão os trejeitos desta personagem, já veio a público anunciar que MR. BEAN EM FÉRIAS deverá ser o seu último título em cinema. Se assim for, o delicioso londrino despede-se em grande, depois de uma desastrada obra de estreia no cinema há coisa de oito anos que tentava «americanizar» em demasia um género que se confunde com a melhor tradição cómica britânica. Desta vez, contudo, é em França que a acção se gera o que aproxima ainda mais Bean das memoráveis composições de Jacques Tati como Sr. Hulot (o próprio Atkinson assumiu a sua inspiração em Tati, na forma como este experimentou a representação gestual muito depois do cinema se ter aproximado do som...). E as longas piadas que decorrem no comboio, na estrada atrás do bilhete preso a uma pata de galinha ou na rodagem de um misterioso anúncio são uma hipótese viável de ligação entre o humor inglês e francês. É precisamente nesta opção pela contenção (só explodindo nas circunstâncias certas), pelo abraço que Bean faz ao cinema europeu (chegando a criticar comicamente os extremos do «cinema de autor» com uma longa sequência rodada numa edição do Festival de Cannes) que o filme convence e, embora ainda não chegue à excelência do modelo televisivo, consegue engrandecer o naipe de caretas, movimentos e tiques de um Bean que ainda tem algo para mostrar na sua descoberta naïve do mundo.

MR. BEAN EM FÉRIAS * * *
Com uma mala na mão e uma câmara digital na outra, Mr. Bean segue viagem com destino a Cannes e a mais um punhado de aventuras com muitos efeitos secundários... Atkinson continua a vestir muito bem a pele da personagem que o ajudou a tornar famoso e sabe onde pode ir nas caretas e trejeitos, levando esta viagem por terras francesas a uma simpática homenagem ao humor europeu e ao cinema em geral... Cenas memoráveis? A do restaurante do comboio da estação logo no início ou os esforços de Bean para não adormecer ao volante. O filme não é cinematograficamente de génio mas é dos produtos mais bem feitos dos últimos tempos para toda a família e estende (na medida do possível) a dinâmica humorística do programa televisivo (que a RTP tem repetido sempre que pode...ou se lembra) por cerca de hora e meia. Querem mais? Parece que Rowan Atkinson não. Missão cumprida: Mr. Bean já faz parte do bom imaginário cómico de todos nós.

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