28 de julho de 2008

NA SALA ESCURA: A ciência do medo







IRA.
«Será que isto pode estar mesmo a acontecer?» ELLIOT (Mark Wahlberg)

Outrora a grande coqueluche do suspense sobrenatural, M. Night Shyamalan começa agora a ser o ódio de estimação dos críticos. Tudo porque ousou realizar um filme que sonhava desde a infância, o desconexo conto de fadas negro que é «A Senhora da Água».

É certo que o filme quer ser muitas coisas ao mesmo tempo e que não consegue atingir nenhum dos seus objectivos plenamente, mas tem emoção da primeira à última cena, um tom onírico que já não é habitual quando associado ao mundo real e, principalmente, uma permanente vontade de colocar a obra na fronteira entre o admissível e o fantástico.

Grande perdedor de há um par de anos, o filme foi odiado até porque o crítico de cinema é uma das personagens alvo de chacota nesta perversão pessoal de Shyamalan. Resultado: era necessária uma obra que voltasse a tornar o realizador de «O Sexto Sentido» ou «A Vila» numa referência do medo psicológico, visceral, mediático.

Pois bem: O ACONTECIMENTO não é o filme da aguardada reconciliação, até porque volta a elevar o experimentalismo para um lugar inesperado, que pode ser desconfortável. Considerado justamente como o «novo Hitchcock», M. Night Shyamalan tem a mente fervilhante dos contadores de histórias e o engenho técnico dos melhores cineastas. Porém, está preso a um estilo cinematográfico que o ameaça corromper. Solução? Ir testando variações cada vez mais ousadas do medo.

Em O ACONTECIMENTO, a excelente premissa convoca uma série de sequências de grande impacto emocional
: motivados por uma estranha ameaça, os seres humanos começam a pôr termo à vida, sem mais delongas. A forma como o fazem é inesperadamente seca e, por isso mesmo, extremamente inventiva.

De facto, M. Night Shyamalan volta a provar que sabe as leis de cor do suspense e cria um óptimo ponto de partida para mais uma fábula com muitas subtilezas inerentes, em matéria de consequências morais.

O problema? A incapacidade de levar até ao fim a ideia de que as plantas decidem atacar os humanos, libertando uma toxina. Há muitos pontos por acertar e nem a ideia «há coisas que nunca vamos saber exactamente por que aconteceram...» chega para justificar um punhado de aspectos que ficam por esclarecer.

Contudo, este não é o filme mau que muita gente proclamou. É mais uma experiência digna de aplauso por mostrar para onde pode ir o terror. Desta vez aliando-o à ciência (ou melhor, àquilo que ela não consegue explicar...).

Se há um mérito que M. Night Shyamalan continua a ter é o de ser um dos poucos que ainda sabe assustar o espectador e surpreendê-lo na cena seguinte. Só por isso merece atenção. E a consideração do seu papel no contexto actual da indústria.

O ACONTECIMENTO
De M. Night Shyamalan (2008)
* * *
Mais um aviso de que a ameaça pode vir de onde menos se espera: neste filme o terror não tem rosto e age de forma inesperada. Um motivo suplementar para permitir que M. Night Shyamalan lance sobre o espectador uma jornada imprevisível, uma nova luta pela sobrevivência, que promete fazer pensar. Contudo, há muitos pontos por explicar... Mark Wahlberg volta a ser um competente actor num conto de pendor ambiental que é também uma singela história de amor. No final, tudo se resume a isso.

25 de julho de 2008

Hitchcock no cinema vs. Hitchcock na TV







INVEJA.
«Gosto de tocar nas pessoas como num piano.» ALFRED HITCHCOCK

Um dos méritos do DVD é ter conseguido «ressuscitar» do limbo audiovisual séries históricas da televisão, que agora passam a estar para sempre disponíveis na videoteca de cada um. Em pequeno, lembro-me de assistir aos casos que Alfred Hitchcock introduzia na memorável série «Alfred Hitchcock Apresenta», ainda sem conhecer de perto a sua filmografia.

É certo que o realizador britânico tem o rótulo de «mestre do suspense» colado à sua imagem, mas para mim - em miúdo - Hitchcock era rei e senhor de narrativas armadilhadas, à espera de twists inevitáveis e quase sempre surpreendentes em capítulos independentes de pouco mais de 20 minutos
.

Hoje, e depois de ter descoberto quase todos os seus filmes, o espectro mudou: Hitchcock é, antes de mais, o cérebro por detrás de clássicos inimitáveis como «Psico», «Os Pássaros», «Janela Indiscreta» ou «Vertigo - A Mulher Que Viveu Duas Vezes».

Sim, um técnico de excepção, verdadeiro arquitecto de emoções, capaz de elaborar intrincados planos em nome de uma boa ideia cinematográfica. Só depois o volto a descobrir nos primeiros 39 episódios da famigerada série, agora impecavelmente restaurada pelas potencialidades do digital.

E o que constato? Que «Alfred Hitchcock Apresenta» foi um importante tubo de ensaio dramático e estilístico para que o cineasta pudesse experimentar premissas estimulantes que uma longa-metragem teria dificuldade em suportar. Sim, a série tem grandiosos pontos altos, histórias ardilosas que vivem à custa de pontos de partida que rapidamente se esgotam.

Há o brilhante episódio em que Joseph Cotten sofre um acidente de automóvel e todos julgam que está morto. Recorrendo a um poderoso jogo de grandes planos, Hitchcock mostra-nos que o protagonista ainda está lúcido mas não consegue colocar o corpo a trabalhar. Quando é identificado como clinicamente morto, o homem só consegue mostrar que está vivo por dentro ao derramar uma lágrima.

Nesta belíssima metáfora, Hitchcock mostra ao que vem e desfaz a ideia de que na televisão não é só o ecrã que é mais pequeno, a qualidade técnica do produto também. Não é verdade, embora a série comece a perder fôlego e os capítulos deixem rapidamente de ser dirigidos pelo mestre (afinal, havia uma carreira cinematográfica a gerir).

No entanto, há «grandes pequenos contos» (sempre a preto e branco) neste primeiro grupo de 39 capítulos - o número escolhido nesta compilação em DVD não é coincidência... Temos o da mulher que força o marido a matar o homem que ela diz que a atacou (quando afinal se vem a saber que ela está demente), o do ventríloquo que vive uma relação de amor-ódio com a sua criação, o do homem que começa a ser perseguido por um sósia, o do pianista que quer saber quem matou o seu pai (quando foi ele mesmo), ou o do empregado desesperado que mata o patrão, embora este apareça vivo e são no dia seguinte.

Extremamente dinâmicos e sem perderem tempo, os breves contos foram, principalmente, uma oportunidade para Hitchcock se mostrar e gerar um culto em torno da sua imagem, ainda hoje difícil de atingir pelos seus colegas.

Sim, tanto as introduções como as argumentações finais do realizador são discursos únicos de arrojo e o reflexo de quem está muito «à vontade» com o espectador.

A proposta dá azo a momentos memoráveis, como aquele em que Hitchcock diz ter descoberto um remédio muito eficaz para a insónia, referindo-se a uma bala e a um revólver.

Embora tenha sido no cinema que Hitchcock expôs totalmente a sua versatilidade, na televisão foi mais longe nas propostas dramáticas e, acima de tudo, revelou que a ironia pode ser uma arma tão letal quanto uma faca ou uma pistola.

21 de julho de 2008

OS MEUS POSTERS: Inadaptado

























GULA.
Querem um grande poster, daqueles mesmo inventivos que reflectem a duplicidade do filme a que se referem? Aqui têm, o de INADAPTADO, imensa reflexão de Spike Jonze sobre o poder da imaginação, com Nicolas Cage dividido em dois (e com crise de identidade), Chris Cooper desdentado e Meryl Streep em êxtase.

15 de julho de 2008

QUIZ: Estes elementos lembram que filme?







Tem havido quem acerte sempre nos mais recentes desafios por isso, e em altura de segundo aniversário do SIN CINEMA (se me dissessem há dois anos que chegaria até aqui, não acreditaria!), decidi «fazer» um doce. É fácil detectar de onde vêm estes ingredientes?

Solução do QUIZ anterior: «O Mundo a Seus Pés», de Orson Welles.

O MAIOR PECADO DE... Dreamworks








PREGUIÇA.
«Não se preocupem em chamar a Guarda Costeira. Este aqui morreu na água.» BOULDER WEEKLY

Querem ver um bom filme passado debaixo de água, com emoção e história coesa? Bem, há duas hipóteses: no caso da imagem real talvez o melhor seja espreitar o clássico de Spielberg «Tubarão», no caso da animação... é melhor ver «À Procura de Nemo» outra vez.

Sempre que a Dreamworks tentou copiar as fórmulas da Pixar, estatelou-se contra a parede e perdeu em todas as comparações.

Aconteceu isso no despique dos insectos com «Antz» face a «Uma Vida de Insecto» (mesmo tendo Woody Allen a dar voz à formiga que é o centro das atenções) e, principalmente, em O GANG DOS TUBARÕES, provavelmente o trabalho mais fraco do curto historial do estúdio, surgido nos anos 90, com Spielberg a liderar as operações numa vontade férrea de concentrar as atenções.

A estratégia deu frutos: não esquecer que tanto «Beleza Americana» como «Gladiador» foram Óscares de Melhor Filme, sendo produções dispendiosas deste novo estúdio. No entanto, na animação, e com excepção de «Shrek» e das produções Aardman - «A Fuga das Galinhas» ou «Por Água Abaixo» -, foram muito poucos os trabalhos que fizeram sombra à Disney.

Não é que se tenham portado mal nas bilheteiras, mas quase nunca conseguiram articular uma boa história com um desenho apurado. Agora que o estúdio se está a tentar desprender da Paramount - há até quem fale que se pode aproximar de Bollywood, com o interesse manifestado por investidores indianos -, e que se estreou um dos mais sólidos trabalhos animados, neste caso «O Panda do Kung Fu», é altura de recordar o ponto mais fraco. E esse é, sem dúvida, «O Gang dos Tubarões», uma reunião colossal de talentos, com De Niro, Jolie, Will Smith ou o próprio Scorsese a darem vozes a figuras animadas, mas sem nenhuma chama enquanto produto audiovisual.

Construído como um sucedâneo sem fôlego de «À Procura de Nemo», o filme conta como Óscar, um modesto esfrega-línguas na lavagem automática do bairro, se torna um herói ao assumir a glória de um acto que, na verdade, não protagonizou. Para manter o segredo, faz amizade com um tubarão vegetariano, mas a mentira tem perna curta: resta-lhe procurar novamente o seu lugar no meio de uma comunidade colorida, inventiva, mas com pouca graça.

O actor Will Smith tenta ser o cerne deste conto, mas a sua personagem não tem um pingo da homegeneidade de Merlin ou Nemo e tudo cai num artificialismo menor. Até a banda sonora, que reuniu Christina Aguillera (em gritos estridentes) e a virtuosa Missy Elliott, é irritante. O resultado é facilmente esquecível.


Críticas de fugir:
- San Antonio Express News: Se houver uma sequela, é possível colocarem algumas bolhas para parecer, desta vez, que a acção se passa debaixo de água?
- ReelTalk Movie Reviews: Falta-lhe a graça e o encanto de que já estava à espera.
- Village Voice: Os realizadores deste filme não têm fé suficiente no mundo que criaram.
- Film Freak Central: Um veículo sem alma para a 'persona' de Will Smith.
- Three Movie Muffs: Com tanto talento reunido, 'O Gang dos Tubarões' deveria ter sido muito melhor do que isto.

12 de julho de 2008

NA SALA ESCURA: Rir é um golpe de mestre







GULA.
«Talvez seja melhor desistir e voltar a vender 'noodles'.» PO (Jack Black)

Todos os verões o ritual repete-se: entre as grandes produções à conquista dos jovens que estão de férias grandes e com muito tempo para ir ao cinema, há um ou outro filme de animação que se esforça por competir com a nova obra-prima da Pixar.

Este ano, a honra coube a O PANDA DO KUNG FU e, o que é certo, é que esta fita de acção combinada com humor físico não fica atrás dos trabalhos do estúdio que já nos deu «Os Incríveis» ou «À Procura de Nemo» e que se prepara para estrear «Wall E».

Divertido e inconsequente, simples na condução da acção e no modo como convoca referências dos clássicos de artes marciais, O PANDA DO KUNG FU é ligeiro - na melhor acepção desse termo - com a garantia de fazer rir. Pelo puro prazer de esboçar um sorriso.

O mérito está na acção, dinâmica e ambiciosa, que segue os passos de um panda anafado e sonhador para se tornar no mestre dos mestres da arte de luta. Po é, antes de mais, uma inteligente composição de Jack Black, cada vez melhor humorista, cada vez mais certeiro num estilo que embaraça, mas que se encaixa como uma luva neste caso.

Depois, há ainda Dustin Hoffman como Shifu, o chefe muito céptico, que tem a missão de provar que os augúrios estavam correctos ao apontarem para Po como a nova esperança para uma comunidade fragilizada.

Nesta boa combinação de vozes expressivas com um desenho irrepreensível, quer na cor, quer no traço, a Dreamworks deixa as vulnerabilidades de outrora e está mais próxima de um grande filme. Sim, O PANDA DO KUNG FU é um grande filme de Verão!


Outra crítica aqui:


O PANDA DO KUNG FU
De Mark Osborne e John Stevenson (2008)
* * * *
A animação já raramente surpreende, dada a multiplicidade de obras cada vez mais parecidas umas com as outras. Neste ponto, O PANDA DO KUNG FU também não é a originalidade das originalidades, mas supera a prova porque se assume logo desde o início como um filme que quer divertir, fazer passar um bom bocado, sem estar à procura de outro objectivo do que ganhar o seu cunho, o seu público. E consegue-o na perfeição. Por esse esforço, pela animação perfeita e pelas vozes de Jack Black e Dustin Hoffman, o filme merece todos os aplausos.

9 de julho de 2008

CINEFILIA: As cinco promessas de Julho








SOBERBA. Para mês de Julho, a oferta até nem é má porque, ao contrário de outros períodos, consegue equilibrar estreias de grande fôlego com cinema de autor. Há espaço para tudo nas salas, embora seja a praia o cenário mais convidativo.

- O PANDA DO KUNG FU: A Dreamworks volta a enfrentar a Pixar e até consegue bons resultados. Trata-se de um divertimento genuíno, com excelentes imagens coloridas, sobre um panda que sonha ser um ás entre os «samurais». Tudo bate certo, em particular a escolha de Jack Black e Dustin Hoffman para darem voz a discípulo e mestre, respectivamente.

- OS AMORES DE ASTREA E CELADON: Numa floresta em pleno tempo dos druidas, o pastor Celadon e Astrea amam-se. Mais tarde, um engano gera um jogo de maldições, neste conto sobrenatural de que não esperávamos ver Eric Rohmer dirigir. Se a curiosidade matasse...

- CAPÍTULO 27 - O ASSASSINATO DE JOHN LENNON: Trata-se de mais um drama biográfico, com a particularidade de não se centrar num herói mas num assassino, Mark David Chapman, o autor dos disparos que vitimaram John Lennon. Diz-se que é o papel da vida de Jared Leto.

- O CAVALEIRO DAS TREVAS: Christopher Nolan «escureceu» Batman que, ao que parece, nunca esteve tão sombrio como neste conto negro, que permite ver Heath Ledger a despedir-se na pele de um alucinado Joker. As expectativas são gigantescas.

- TROPA DE ÉLITE: José Padilha criou o filme de cinema brasileiro mais falado desde «A Cidade de Deus» e a violência volta a ser o tema central, prometendo expressividade, choque e uma realização inabalável neste olhar para as milícias traficantes de droga e a polícia.

4 de julho de 2008

OS MEUS POSTERS: A Loira Platinada




























SOBERBA.
As Sessões na Esplanada regressaram à Cinemateca. Em Julho e Setembro revisitam-se as meninas dignas de posters, as «pin-ups» de sempre. Sempre às 22h30 (de quinta a sábado), lembram-se Rita Hayworth, Raquel Welch ou Jean Harlow (aqui em A LOURA PLATINADA, no ar quinta, dia 10).


Saiba mais aqui

Saudades da «Nouvelle Vague»







INVEJA.
«Toda a montagem é uma mentira.» JEAN-LUC GODARD
Dois amigos desavindos - vestidos com roupas de adultos, mas presos aos tumultos psicológicos da juventude - juntam-se a uma jovem de saia às pregas, de olhar perdido e com vontade de experimentar coisas novas. Num café, seguem a música de uma «jukebox» e simulam uma longa coreografia, simples, ritmada e completamente despropositada segundo os cânones do cinema clássico.

É tudo e é nada aquilo que Jean-Luc Godard quis passar nesta sua bela obra BANDO À PARTE, um testemunho importante para a «nouvelle vague» francesa
, aquela forma de fazer filmes com desejos de liberdade, rompendo cânones, colocando a câmara em lugares impossíveis, transmitindo uma atitude pouco adepta de cortes e impressionada com um certo realismo disfarçado de pose artística espoontânea.

Este trabalho de Godard é tudo porque comporta em si uma aura de arrojo que fez bem ao cinema, deu-lhe cunho próprio e vontade em mostrar algo mais do que é premeditadamente encenado. É nada porque perverte a noção de controlo total do realizador sobre uma história, um plano, uma acção.

No fundo, esse controlo está todo lá, mas acaba por preferir deixar espaço ao improviso, à falha, aos planos mais longos, à monotonia.

Tudo isso é estudado, tudo isso é transposto para o ecrã com a nítida noção de que o cinema pode ser muitas coisas ao mesmo tempo.

Em BANDO À PARTE, o que se quer é criar uma pessoalíssima homenagem aos filmes policiais que Hollywood deu a conhecer na década de 40. Há uma leve referência ao film noir, embora a aura juvenil e o sentido europeu de uma certa forma de descobrir e revelar o mundo se sobreponham a esforços mais empenhados para lembrar o cinema norte-americano.

Os dois amigos desta história, que planeiam desordenadamente assaltar a casa da sua cúmplice Odile (musa e na época esposa de Godard, Anna Karina) não são os gangsters convencionais.

Parece tudo - até o plano de assalto à casa da «tia Victoria»! - faz de conta, há um constante simular de intenções, muitas divergências narrativas e até espaço para pensamentos soltos. A «nouvelle vague» foi isso: deixar que tudo tivesse o seu espaço, mesmo que desordenado.

No final desta história a preto-e-branco (aplausos para a fotografia de Raoul Coutard), há a tragédia. Muda e inabalável, para mostrar que o mundo não se compadece com brincadeiras e golpes inconsequentes. Há sempre uma ordem, o tempo passa. E isso também nos mostrou este novo cinema: depois de imersos na ficção, despertar para a realidade custa ainda mais!

3 de julho de 2008

OS SETE PECADOS DE... Junho 2008








LUXÚRIA.
No meio de uma semana de férias, fui ao cinema descobrir que a comédia juvenil pode ser romanticamente violenta e, ainda assim, não ceder na inteligência. Próximo do nível de «Um Azar do Caraças» - não é por acaso que é dos mesmos produtores - UM BELO PAR DE PATINS (título terrível para «Forgetting Sarah Marshall») é já um dos trabalhos mais bem dispostos dos meses quentes, apesar de lidar sem grandes pudores com a dor da traição. O olhar é ousado, divertido e intelectualmente estimulante. Isso é possível? Parece que sim... Até mete ao barulho uma ópera com marretas a simular a história de Drácula. Cheio de ideias, só se alonga demasiado na sua premissa de descodificar os afectos quando o coração fica em cacos. É pena.


INVEJA. De vez em quando uma boa ideia: apesar de continuar a usar e a abusar dos anúncios no início das sessões, a Lusomundo começou a fazer intervalos de dez minutos onde insere um ou outro «trailer». Uma maneira sagaz para gerir os 10 minutos do desconforto. Quem quiser, vai à sua vida, quem preferir, fica a saber o que aí vem.

SOBERBA. Numa altura em que a colecção de DVD está tão apinhada que estou a fazer uma pausa nas aquisições, fiz anos e pedi apenas um filme. Ou melhor, uma deliciosa compilação de curtas-metragens: trata-se da série «A Ovelha Choné», produzida pelos estúdios Aardman (sim, dos mesmos criadores de «Wallace & Gromit» e «A Fuga das Galinhas») e que está a ser apadrinhada - e bem! - pela RTP. Tratam-se de pequenas histórias para os mais novos protagonizadas por um rebanho de ovelhas caprichosas, feitas de plasticina e muito espertas. O único que parece mais lento nos pensamentos e nas reacções é o seu dono. São pérolas de pouco mais de cinco minutos, com humor «very british», absolutamente imperdíveis.

GULA. Apesar da pausa na compra de DVD, não cedi à tentação. Em liquidação total, o «Daily Price» da Av. de Berna possibilitou a seguinte pechincha: comprei os filmes «Apanha-me Se Puderes», de Spielberg, «2046», de Wong Kar-Wai, a obra oriental «O Bordel do Lago», o ardiloso «The Heist - O Golpe» de David Mamet, e «A Pantera Cor-de-Rosa», de Blake Edwards, por um total de 12,5 euros (!!!). Sim, isso mesmo. Foi só desta vez...

IRA. É certo que David Cronenberg descobriu que a violência pode ser filmada num nível muito elevado. Depois do soberbo «Uma História de Violência», só há pouco descobri «Promessas Perigosas», que é um olhar desencantado sobre a máfia americana. Por isso, e pelo ambiente de negrume que perpassa toda a fita, a obra é novamente para aplaudir. Cronenberg continua a ser certeiro nos «socos no estômago».

PREGUIÇA. Alguém compreende a lógica de programação do canal MOV? Aquele de filmes e séries que a Zon já disponibiliza no pacote clássico e no outro, o «Funtastic Life» em HD, sendo que os exibe sem horas fixas, sem linha de orientação... Há bons filmes para ver, não se percebe é quando. Nestas coisas, a bem do espectador, há que ser um pouco previsível. Não na oferta, mas nos momentos de exibição.

AVAREZA. Não sou egoísta. Nunca fui, mas sempre que empresto um filme e ele fica semanas e semanas, depois meses e meses, em casa alheia, sinto algum desconforto. Pequenino, mas sinto. «Mea culpa!»