28 de agosto de 2008

OS MEUS POSTERS: Diários de Che Guevara
























GULA.
Finalmente chegaram as férias... e vão ser, mais uma vez, no outro lado do mundo. Patagónia (Chile e Argentina) cá vou eu! Espera-se uma jornada mais condensada mas igualmente intensa à retratada em DIÁRIOS DE CHE GUEVARA, o belo filme de Walter Salles. Até ao meu regresso.

O alemão que gosta de questionar o cinema







INVEJA.
«Passei de um criador de imagens a um contador de histórias.» WIM WENDERS

Para quem não reparou, o canal pago TVCine 2 está a realizar uma importante e muito completa retrospectiva à carreira do alemão Wim Wenders. Daquelas quase dignas de Cinemateca, o que é muito raro no nosso quotidiano televisivo, mesmo nos algo preguiçosos canais especializados (e até de valor acrescentado).

Como me parece que o desafio deve ser repetido, pus-me por instantes a pensar naquilo que Wim Wenders já deu ao cinema... E foi muito!

Quem considera que o cinema é terreno fértil para novas experiências e os lugares seguros só o são até serem ultrapassados, gosta de Wim Wenders.

Um dos mais elogiados realizadores europeus da actualidade, começou por ser exemplo da nova vaga alemã e tem sabido absorver as tendências dramáticas de outros territórios. As influências são mais do que muitas e um filme raramente é semelhante a outro.

Aos 63 anos, tem já um memorável catálogo de obras e um arrojo narrativo que ainda se consegue enquadrar nos modelos contemporâneos para lá de Hollywood.

Nascido em Düsseldorf, começou por estudar medicina e filosofia mas, no atribulado ano de 1968, cedeu ao espírito criativo e entrou para a Academia de Televisão e Cinema de Munique.

O fascínio para a sétima arte já vinha de longe, desde que descobrira a arte das imagens a partir de um velho projector. Admirador confesso de realizadores como Yasujiro Ozu (a sua grande referência) e Nicholas Ray (que dirigiu no tocante «Nick’s Movie»), Wim Wenders começou por dar nas vistas em algumas curtas-metragens. Pelo caminho, escreve em revistas da especialidade e estreia-se, em 1972, nas longas com «A Angústia do Guarda-Redes Diante do Penalty».

«O sexo e a violência nunca foram muito o meu estilo. Sempre estive mais interessado no saxofone e em violinos», ironizou um dia numa entrevista.

Para o lugar selectivo das grandes obras-primas do cinema europeu deixou títulos como «As Asas do Desejo» ou «Paris, Texas» – numa bem sucedida experiência pelos Estados Unidos, terra onde também rodou «Hammett, Detective Privado» ou «Crimes Invisíveis».

Frequentemente requisitado para altos cargos do cinema, nomeadamente a nível europeu, presidiu ao Festival de Cannes em 1989 e chegou a ser nomeado para o Óscar graças ao documentário sobre a música cubana num dos seus mais populares filmes, «Buena Vista Social Club».

Teve ainda a oportunidade de mostrar por diversas vezes o seu fascínio por Portugal, utilizando Sintra para cenário de «O Estado das Coisas» e Lisboa em «Até ao Fim do Mundo».

A capital chegou até a dar nome a um curioso trabalho, «Viagem a Lisboa», inteiramente dedicado à cidade, com direito a uma presença memorável da banda Madredeus.

Sem abrandar o ritmo, está já em pós-produção a longa-metragem «8», em que partilha a realização com sete cineastas do calibre de Jane Campion, Mira Nair, Gaspar Noé, Gus Van Sant ou o jovem actor Gael Garcia Bernal. «Passei de um criador de imagens a um contador de histórias», chegou a dizer também. O cinema precisa dele.

25 de agosto de 2008

NA SALA ESCURA: Coração de metal








GULA.
«Não quero sobreviver. Quero viver!» Capitão

Quando pensamos que os filmes da Pixar correm o risco de ficarem formatados por fórmulas já conhecidas, eis que há um novo passo pelo terreno da inovação, neste caso explorando as muitas ramificações que um filme de ficção científica pode esconder.

É certo que há um fundamento moral nesta fábula apocalíptica, um herói que muitos já compararam a E.T., mas e depois?

WALL-E apela ao lado infantil que todos escondemos, ao assombro que se faz por imagens mais do que palavras
e à ternura que nasce ao testemunhar que um boneco de metal esconde a fragilidade e os gostos de um ser humano.

A fórmula assemelha-se à de Pinóquio, mas não perde demasiado tempo na conquista de um coração. O robô protagonista aceita-se tal como é desde o início e vai perceber que pode conquistar tudo à sua volta se lutar por isso...

É esta a moral de mais uma prodigiosa metáfora sobre os limites da Humanidade. Pelo caminho, o realizador Andrew Stanton aproveita para homenagear a ficção-científica (as alusões a universos como os de «2001 - Odisseia no Espaço», de Stanley Kubrick», ou de «Alien», de Ridley Scott» são assumidas) e explicar como o progresso não traz só coisas boas.

Mais um tratado inteligente da Pixar, que parece cada vez mais interessada em assumir-se como laboratório de novas ideias. A animação só ganha com isso.


Outra crítica aqui

WALL-E
De Andrew Stanton (2008)
* * * * *
Quando já não existe vestígio humano na Terra, o futuro pode estar nas mãos de um robô simplório que empilha lixo. Sim, é assim que começa esta colossal animação (a mais cara de sempre...), mais uma vez certeira na capacidade de emocionar o espectador. A jornada da máquina apaixonada por um outro robô topo de gama condensa o lado mais existencialista da ficção científica com a pura aventura apocalíptica, que tem tudo para se tornar um clássico. Ao jogar com as imagens, mais do que com as palavras, WALL-E ainda expõe mais a sua força. No fundo, é a última obra-prima da Pixar.

18 de agosto de 2008

OS MEUS POSTERS: Terra Bruta
























IRA.
Não é o filme mais citado da carreira de John Ford, mas foi o que revi recentemente e impressionou pelo modo como desconstrói a relação entre índios e cowboys. Depois, tem ainda o mérito de tornar James Stewart num cínico de primeira linha. TERRA BRUTA respeita tudo do western.

16 de agosto de 2008

Rindo sobre telhados de vidro








AVAREZA.
«Sempre quis ser um Tenenbaum.» Eli (Owen Wilson)

Sou um acérrimo defensor do estilo de Wes Anderson, desde o tímido «Gostam Todos da Mesma» à viagem espiritual de «The Darjeeling Limited».

E o que já se nota na sua obra? Um lado cénico forte, diálogos mordazes de fazer inveja e uma permanente inquietação com a perda da união familiar.

Lembro-me disso com OS TENENBAUMS - UMA COMÉDIA GENIAL, obra maior que colocou actores de elevado calibre a darem corpo, com afinco, a um conjunto de personagens fragilizadas precisamente pela ausência de uma estabilidade familiar.

Neste ponto, o filme é talvez o mais característico da carreira de Anderson. A história assume contornos satíricos, enquadrados numa estrutura literária bem conseguida, fazendo lembrar um qualquer romance de cordel.

A espontaneidade das intenções argumentativas bate certo com o fino recorte humorísitico que domina toda a fita. Royal Tenenbaum (Gene Hackman) é o patriarca ausente do contexto familiar por muitos anos, que um dia decide voltar ao convívio do lar.

Porém, aquilo com que se depara mostra um vazio emocional que é partilhado tanto pela sua esposa (Anjelica Houston) como pelos seus três «geniais» filhos: Chas (Ben Stiller), o mais velho, um investidor milionário deprimido com a morte da mulher; Margot (Gwyneth Paltrow), a filha adoptiva, escritora de sucesso que tem um casamento infeliz; e Ritchie (Luke Wilson), um tenista profissional que vive isoladamente apaixonado pela sua irmã.

Royal procura então restabelecer o contacto afectivo com o seu clã, mas logicamente é desprezado por todos.

O filme relata então o desejo de aproximação e a busca por um novo elo familiar, que se esbate no confronto com o lado neurótico e absurdo de todas as personagens. Esta é a fase em que Wes Anderson parece mais seguro da sua forma de filmar, dada não só a minúcia da encenação, como o detalhe dos adereços (também bastante explorado, por exemplo, em «The Darjeeling Limited») ou o lado acutilante dos diálogos.

No fundo, o filme assume-se como um caleidoscópio de neuroses que procura fazer rir das fragilidades alheias. Mas é um riso sincero, pouco malicioso.

Poder-se-ia comparar esta obra a uma espécie de «Beleza Americana» non sense, dada a profundidade com que cada personagem lida com a solidão e as emoções indesejadas.

É como o riso maquilhado de um palhaço, que pode camuflar a tristeza latente do seu espírito, fintando o espectador numa aparente superficialidade das acções, mas que deixa a descoberto um sentido profundamente satírico - expressão macambúzia da personagem de Gwyneth Paltrow é bem paradigmática disso mesmo.

No final, percebe-se que o que se pretende é rir com a delicadeza e a crueldade dos defeitos. Ou melhor, sorrir envergonhado. A nossa família também tem algo de disfuncional...

10 de agosto de 2008

QUIZ: A que filme pertence esta imagem?









Em época estival, nada como recordar um dos melhores filmes a «homenagear» a praia. Uma óptima pista para mais este desafio...


Solução do QUIZ anterior: «A Fuga das Galinhas»

7 de agosto de 2008

CINEFILIA: As cinco promessas de Agosto








GULA.
Em plena silly season já se pressente uma escassez de boa oferta nas salas e a preferência pelo grande espectáculo, muitas vezes sem qualidade digna de registo. E já se começam a vislumbrar os vencedores e os perdedores da temporada: «O Cavaleiro das Trevas» e «Wall.E» são alguns dos mais bem sucedidos, enquanto o regresso de «X-Files» ou a animação «Macacos no Espaço» nunca deviam ter visto a luz do dia... Assim parece!

- HELLBOY II - O EXÉRCITO DOURADO: O regresso há muito esperado do mais cínico e contra-corrente dos super-heróis. Esperemos que a veia expressionista de Guillermo Del Toro se mantenha, assim como a ironia de Ron Perelman. Há quem diga que sim, que a solidez do primeiro filme se mantém. Ainda bem.

- WALL. E: A aposta deste Verão da Pixar é feita de metal e muitas interrogações sobre o sentido da vida. E mais uma vez acertou nesta revisitação pomposa de uma ficção científica elaborada em tom de fábula. Tudo porque um robô, sempre a fazer aquilo para que foi programado, descobre que pode ir mais além quando conhece uma atraente máquina, chamada EVA. Quem viu, não esquece mais.

- THE HOTTEST STATE: O filme esteve para estrear há coisa de dois meses, mas desta é que parece que é... Já tentou a sorte na escrita, agora esmera-se na realização. O actor Ethan Hawke é daquelas eternas promessas que nunca chegou verdadeiramente a confirmar-se. Como se sai atrás das câmaras? O travo indy do filme chama a atenção e aguça a curiosidade, neste conto pessoal sobre as peripécias de um actor para vingar na carreira, enquanto luta para manter sólida uma relação amorosa com uma compositora.

- ROGUE: Desde o excelente «A Criatura» que andamos a salivar por um novo filme de monstros. Ele aqui está, com bastante espírito série B, dirigido pelo mesmo criador do aterrorizante «Wolf Creek».

- STAR WARS: A GUERRA DOS CLONES: Tem sido dos projectos mais falados dos últimos tempos, por voltar à saga de George Lucas, mas desta vez convocando apenas a apurada técnica digital da animação. Será uma boa nova ou uma tentativa de comprometer um conjunto de filmes que já tiveram o seu tempo?

6 de agosto de 2008

O QUE AÍ VEM: Burn After Reading








SOBERBA.
«É uma coisa engraçada: as pessoas acusam-nos de ser condescendentes com as nossas personagens de alguma maneira - isso para mim é inexplicável.» JOEL COHEN

Que fazer depois de um Óscar? Tudo igual ao que se fazia antes, dizem os irmãos Coen. Se houve algo que mudou com a atenção dada a «Este País Não é Para Velhos» é que se recuperou o prestígio, que desde «O Grande Lebowski» andava algo arredado entre os mais puristas, e ganhou-se mais meios para seguir em frente.

Independentemente dos seus méritos artísticos, o próximo trabalho dos irmãos Coen, BURN AFTER READING, tem já o prémio de ter o elenco mais cool da temporada
: a Brad Pitt e George Clooney juntam-se a recém-oscarizada Tilda Swinton, a sempre excelente Frances McDormand e John Malkovich.

O ponto de partida volta a ser prometedor: um disco que contém as memórias de um agente da CIA vai parar às mãos de dois trabalhadores de um ginásio sem escrúpulos que tentam posteriormente vendê-lo.

Esperemos que seja mais na onda do cinismo de «Fargo» do que no superficialismo de «O Quinteto da Morte».

5 de agosto de 2008

OS SETE PECADOS DE... Julho 2008








INVEJA.
Na habitual abordagem às revistas de cinema lá de fora (sim, porque por cá a oferta não existe...), houve um surpreendente motivo de orgulho. Na prestigiada «Sight & Sound», o filme do mês de Junho foi o português JUVENTUDE EM MARCHA. Sim, o poderoso olhar de Pedro Costa para Ventura e outros habitantes (quase fantasmagóricos...) do Bairro das Fontainhas mereceu duas bonitas páginas desta publicação britânica. E os elogios não faltam: a fotografia é comparada ao «chiaroscuro» das pinturas clássicas, as imagens lembram «fotografias estáticas». O crítico apela a mais do que um visionamento deste trabalho de um «dos realizadores mais talentosos a nível europeu», para se perceber de perto todas as subtilezas de um documento doloroso mas, mais do que tudo, humano. Sabe bem ver que o reconhecimento merecido ainda encontra o seu lugar.


LUXÚRIA. Já havia lido com particular agrado o livro de Somerset Maugham, mas só agora tive a oportunidade de contemplar o entusiasmante desempenho de Annette Bening em «As Paixões de Júlia». Sim, o seu jogo de interesses para se manter no topo das melhores actrizes de teatro resulta numa competente adaptação, sem grande novidade, até demasiado certinha e seguidista dos filmes de género, mas que se supera com o furacão Bening, aqui a oscilar entre um casamento sem sexo com um Jeremy Irons low profile e a relação voraz com um jovem oportunista. O palco é todo seu!

IRA. A natureza pode virar-se contra nós, avisa-nos M. Night Shyamalan no seu mais recente filme, «O Acontecimento», mal aceite pela crítica e que voltou a colocá-lo longe dos dias de glória de «O Sexto Sentido» ou «Sinais». Ainda assim, mais um bom teste de suspense, com premissa aliciante e cenas de terror que assustam, de facto. O talento ainda não se escapou.

GULA. A colecção que o jornal «Público» elaborou a partir de um catálogo da revista «Cahiers du Cinéma» acabou em beleza: um excelente documento sobre o português Manoel de Oliveira, à beira do centenário, é a melhor homenagem que um jornal de referência lhe podia fazer. Muito bem escrito e com olhar minucioso para uma história que se estende por todo o cinema português, este trabalho de Mário Jorge Torres merece ser bem recebido não só pelos cinéfilos, mas também por todos os que se interessam pela cultura nacional. O serviço público andará por aqui...

AVAREZA. Um filme de fantasmas, falado em espanhol e passado numa mansão pode não parecer novo, mas é. «O Orfanato» volta a colocar o terror intimista na ordem do dia e confirma Guillermo Del Toro não só como excelente realizador, mas também como produtor interessado no ponto de vista do espectador.

PREGUIÇA. Aos fins destes meses de mudança, ainda poucos terão entendido a razão porque os quatro canais de cinema premium, agora TV Cine, terão mudado de perfil. Se antes apostavam em géneros, agora cada um exibe os filmes do outro ao lado, pelo que nada os distingue. A pergunta impõem-se perante esta estratégia: por que razão são então quatro e não apenas dois?

SOBERBA. Ir a uma «Sessão na Esplanada» na Cinemateca é um luxo. Daqueles muito simples, é certo, mas que sabem sempre bem. Já são um ritual anual. Este ano a sessão foi «Pintores e Raparigas», uma comédia muito ligeira com Dean Martin a cantar e Jerry Lewis a fazer das suas, enquanto ambos sonham com a glória e tornarem-se artistas de relevo na banda desenhada. A pin up de serviço é «uma estreante» Shirley MacLaine.

1 de agosto de 2008

NA SALA ESCURA: Ainda há fantasmas







IRA.
«Não se trata de ver para crer, mas de crer para ver.» Aurora (Geraldine Chaplin)

O cinema de terror sobrenatural não se compadece com meios termos: ou é uma experiência maior se for bem feito ou cai no ridículo se for dado algum passo em falso ou feita uma cedência maior aos clichés do género.

A boa notícia é que O ORFANATO pertence à primeira categoria, dado explorar o território da casa assombrada com a digniddade de um bom filme intimista, carregado de terror psicológico e... fantasmas
!

Êxito fenomenal do cinema espanhol, tem a mais-valia de ter sido produzido por Guillermo Del Toro, o que se pressente quer no cuidado plástico da produção, como no imaginário visual, de tonalidades negras, que se pressente da história (com a memória de «O Labirinto do Fauno» ainda muito presente).

Sem recorrer ao gore ou aos sustos estilizados, o filme é generoso em sequências de suspense, mas quase tudo ocorre naquilo que não se vê (e que se quer ver). Uma fórmula experimentada em muitos filmes de terror, mas raramente com efeitos tão bons como neste caso. O susto assim até vale a pena...


O ORFANATO
De Juan Antonio Bayona (2007)
* * * *
O cinema de terror tem no seu catálogo de cenas memoráveis a face queimada de Freddy Krueger, a máscara da trilogia de Scream ou o vómito da menina possuída de O Exorcista. Agora também já tem a máscara do rosto disforme deste filme espanhol, bom exemplo de uma técnica apurada em nome de uma história de fantasmas coesa e intimista. A jornada de uma mãe para encontrar o filho (obrigando-a a embarcar no território do sobrenatural) é rica e muito negra. Algo que fica bem num contexto de demasiados filmes para pouca emoção. O Orfanato tem a receita certa de medo.