30 de dezembro de 2008

OS SETE PECADOS DE... 2008

Foi um ano de bom cinema do mundo, razoáveis propostas com génese em Hollywood, mas de menores idas à sala escura. É certo que foi período de crise, mas nada de falhas em matéria de criatividade. Para completar o «Top 10» há ainda que referir «A Turma», «4 Noites com Anna» e o simpático «Filho de Rambow: Um Novo Herói», cuja crítica não deve tardar. E venham mais filmes!

AVAREZA. O realizador turco Fatih Akin já é um cineasta extraordinário, mas anteve-se um futuro radioso. A obra do ano chama-se DO OUTRO LADO e é um conto melancólico sobre vidas divididas entre a Alemanha e a Turquia, ao mesmo tempo que se enleia a morte numa teia muito bem urdida. Há contenção de meios, mas não de ideias cinematográficas. O cinema-emoção tem aqui a sua cartada mais forte.

SOBERBA. Olhar o futuro pode dar azo a muitas interpretações, mas certamente redutoras quando comparadas com a visão da Pixar. WALL-E foi a surpresa animada do ano, que apostou em silêncios e muita metáfora existencialista ao dar um enorme coração ao boneco electrónico dos olhos tristes, que se apaixona por uma robot topo de gama. Carregadinho de conceitos e acção elaborada, o filme vai sair de Óscar debaixo do braço. Afinal há futuro para o desenho animado!

INVEJA. Num só ano, dois filmes dos irmãos Coen. Mas o melhor veio antes: ESTE PAÍS NÃO É PARA VELHOS representa o regresso às origens da dupla, que voltam a mostrar ser única na altura de descontruir o thriller enraizado no medo, no engano e na figura do perdedor. Levou as principais estatuetas douradas para casa e revelou o pior penteado de sempre... o de Javier Bardem. Já é um clássico.

PREGUIÇA. Podem acusar Wes Anderson de estar preso a um estilo. Nesse contexto, THE DARJEELING LIMITED é um caso de imensa preguiça. Mas da boa para os aficionados da gestão dramática assente nas relações familiares despedaçadas, nos enquadramentos estáticos, nas falas lacónicas e pejadas de ironia e nos décors muito ricos em pormenores estéticos. Adorar esta história tem algum mal? É o filme cool do ano.

IRA. Tentar fugir às regras do mundo ocidental pode dar mau resultado... mas um belo filme. Sean Penn foi longe neste O LADO SELVAGEM, um conto trágico, baseado em factos reais, sobre a vontade de ter a alma (e o corpo) livre de vícios e apegos, mas correndo-se o risco de perder a própria humanidade. Emile Hirsch tem um dos desempenhos do ano. Mas é a própria visão estilhaçada de Sean Penn que dá mais consistência à obra

GULA. Tim Burton gosta de sangue... e a sua veia negra encaixou como uma luva nesta adaptação sumptuosa de SWEENEY TODD, um musical soberbo com Johnny Depp novamente em auto-superação. O cuidado plástico é único e a veia gótica também ainda lá está. As perversas empadas são a gulodice errante do ano.

LUXÚRIA. Espanto de 2008: O SEGREDO DE UM CUSCUZ. É certo que também pode ser entendido como caso de gula, mas é principalmente um belo retrato humano sobre pessoas desajustadas. São os laços familiares que se testam aqui, por onde passam suspeitas de traição. No entanto, este grandioso melodrama é um filme de personagens. Que merecem todo o respeito.

TOP 10 de 2008
1 - DO OUTRO LADO
2 - WALL-E
3 - ESTE PAÍS NÃO É PARA VELHOS
4 - THE DARJEELING LIMITED
5 - O LADO SELVAGEM
6 - SWEENEY TODD
7 - O SEGREDO DE UM CUSCUZ
8 - A TURMA
9 - 4 NOITES COM ANNA
10 - FILHO DE RAMBOW: UM NOVO HERÓI

27 de dezembro de 2008

O QUE AÍ VEM...O Caso de Benjamin Button

SOBERBA. «Chamo-me Benjamin Button e nasci em circunstâncias peculiares. Enquanto toda a gente ganhava idade, eu ia ficando mais novo... sozinho.» BENJAMIN BUTTON (Brad Pitt)

Falta ainda cerca de um mês para conhecermos o filme que está nas bocas de todos e é tido como o grande favorito para a próxima temporada de festivais - primeiros sinais? Já recebeu cinco nomeações para os Globos de Ouro. O que é certo é que, independentemente dos galardões, este melodrama extremamente sensível já merecia toda a atenção por representar a entrada de David Fincher neste género.

Espera-se que o realizador de «Se7en» ou «Clube de Combate» seja capaz de reinventar o drama existencial como o fez, quer com o filme de suspense puro, quer com o policial cerebral (sim, estou a referir-me a Zodiac).

De acordo com as primeiras críticas, parece que sim... e o tom fantástico da história, que culmina com um amor impossível, só lhe dá nuances que estávamos à espera de ver pela mão segura e multicriativa de Tim Burton, por exemplo, mas que não se esperava de um realizador aparentemente agarrado a um realismo cru, comprometido com as falhas interiores, e adepto da violência. E o que nos conta O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON? A vida bizarrra de um homem que nasce idoso e... à medida que os anos passam vai rejuvenescendo.

Uma antítese que servirá também para gerar interrogações sobre o sentido da vida. Depois, ao que parece, há um desempenho muito elogiado de Brad Pitt, cada vez mais empenhado em tornar-se um actor que gosta de arriscar e não se importa nada em ocultar a imagem de sex symbol que muitos (ou melhor, muitas) têm dele, e outro de Cate Blanchett - qual é a novidade?

Ainda assim, é o drama inscrito numa triste fantasia que parece estar a convencer multidões e a dar mais uma achas para o rótulo de «melhor cineasta da sua geração em Hollywood» a David Fincher. Quanto ao mote da história, é curto e muitíssimo eficaz: «A vida não se mede em minutos, mas em momentos.»

26 de dezembro de 2008

NA SALA ESCURA: A obsessão de olhar






INVEJA.
«A única coisa mais terrível do que a cegueira é ser a única pessoa que consegue ver.» MULHER DO MÉDICO (Julianne Moore)

Neste final de ano cinematográfico houve duas belas (e muito tristes) histórias com o denominador comum que é a força do olhar. Algo que permite pensar que é esse mesmo sentido que possibilita ao cinema ser a força que é. É pelo olhar que tudo se constrói, que se desfazem dúvidas, até porque, e apesar de poder dar azo a interpretações erróneas, é também o único meio utilizado para erradicar os últimos vestígios de dúvida.

Numa altura em que proliferam as imagens e em que o dito olhar se disciplina em função de múltiplos ecrãs, é interessante que o cinema também procure reflectir sobre as consequências de ver e ser visto.

QUATRO NOITES COM ANNA, do polaco Jerzy Skolimowski, e ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, do brasileiro Fernando Meirelles, têm ainda a mais-valia de serem obras com a sua essência longe de Hollywood - é certo que o segundo caso é uma produção norte-americana, mas à parte de alguns actores, toda a equipa técnica veio dos quatro cantos do mundo. Este é um facto que permite entender as imagens sob uma outra perspectiva e os resultados são diversos - embora igualmente enriquecedores.

No caso de QUATRO NOITES COM ANNA, a noção de olhar é proibida, ou melhor o protagonista desta desesperada história de amor (que caminha a passos largos para a obsessão) quer ver à força a intimidade de uma mulher por quem nutre uma paixão avassaladora. Léon Okrasa (excelente na contenção, Artur Steranko) é um homem triste, com uma noção do real algo atabalhoada, que trabalha no crematório de um hospital - na sequência desta profissão, o início da história aparece estranho.

Aos poucos, fica-se a saber que houve uma violação e que a vítima desse facto é uma jovem enfermeira que trabalha no mesmo hospital. Mais à frente, percebe-se que a mulher de cabelos louros é o interesse romântico deste homem, que aproveita as noites para entrar no seu quarto e contemplá-la longa e ternamente. E é assim que se cria um amor impossível, em que só um olha, tentando daí extrair uma intimidade forçada.

As cenas agenciam-se de forma mais expressionista do que cronológica. Algo que aumenta a intensidade de uma obra que se inscreve precisamente no território das emoções, dos afectos desesperados e que precisa do olhar para concretizar o amor. No meio desta panóplia de sentimentos e actos proibidos, o final não pode ser pacífico...

Já em ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, a missão era hercúlea: adaptar o romance aparentemente inadaptável que é a obra de José Saramago. O brasileiro Fernando Meirelles disse sim e seguiu em frente num dos mais arrojados projectos dos últimos tempos... A história de Saramago parte de uma cegueira colectiva para ajudar a reflectir sobre a Humanidade. Pois bem, o filme capta inteiramente essa essência e dá-lhe uma força conotativa justamente por passar a mensagem em imagens.

Para lá das diferenças entre um livro e um filme, a obra resolve a problemática da cegueira muito bem, expõe todos os medos e inseguranças, transmite a degradação com particular atenção e mostra as personagens assumidas com particular sentido dramático, graças aos esforços de um painel de actores talentosos - com natural destaque para a virtuosa Julianne Moore, uma das actrizes de primeira linha que ainda gosta de arriscar... E é pela personagem da mulher do médico que a problemática do olhar ganha outra dimensão, dado ser ela a única que vê numa terra de cegos. E não, ela não é rainha: é antes a única (naturalmente, além do espectador) que vê as últimas consequências do que é agir sem ver e pior - pensando que mais ninguém o vê!

Apesar das múltiplas críticas, a obra é sólida e faz jus ao património literário de Saramago. Assim, e apesar de serem projectos distintos, estes dois filmes têm algo que os une: fazer pensar sobre os limites do olhar. E eles não são assim tão estreitos.

4 NOITES COM ANNA
De Jerzy Skolimowski (2008)
* * * *
O produtor Paulo Branco continua a saber escolher os cineastas com quem escolhe trabalhar. É certo que Skolimowski estava parado há algum tempo, mas o modo soberbo como constrói planos, ambientes e desmonta os cânones dos afectos tornam este trabalho num dos mais sólidos deste fim de ano. É um belíssimo tratado de amor e sobre até que ponto a ingenuidade pode ser perversa. Da Polónia chega-nos um conto desencantado. Que mostra os tormentos de um homem que quer apenas ser aceite.

ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
De Fernando Meirelles (2008)
* * * *
Foi o filme-polémica deste último trimestre, mas merecia mais apoio. O realizador brasileiro de «Cidade de Deus» continua a mostrar talento e vontade em elevar as imagens para um plano pouco coincidente com as regras de Hollywood. E é isso que se volta a encontrar nesta tocante e merecedora de aplauso adaptação do romance de José Saramago. «Ensaio Sobre a Cegueira» é um apelo aos sentidos, ora grotesco ora sensível. Muito bom tecnicamente, tira ainda partido da força da natureza que é Julianne Moore.

23 de dezembro de 2008

ILUSÕES DE ÓPTICA: O melhor no Natal

OS MEUS POSTERS: Bad Santa























GULA.
Para assinalar a presente época, escolhi desta vez um filme que é um pouco uma ironia face ao consumismo, o simpático BAD SANTA. Mas, a maior de todas as ironias é que o protagonista acaba por render-se aos seus valores e... ao coração. No fundo, somos todos iguais.

20 de dezembro de 2008

Os 10 melhores filmes segundo Tarantino







SOBERBA.
«Quando as pessoas me perguntam se estudei numa escola de cinema, respondo que não, que aprendi a ver filmes.» QUENTIN TARANTINO

Ainda existem boas ideias: habituada a listas dos «melhores de sempre», a revista britânica «Empire» lançou recentemente os 500 filmes mais importantes de todos os tempos, numa edição ambiciosa que contemplou 100 capas distintas - já antes me referi a esta exuberante edição... Para celebrar o momento, a revista foi ainda mais longe e pediu a pessoas influentes do ramo cinematográfico para também anunciarem a sua lista de filmes preferidos.

O realizador Quentin Tarantino foi um dos convidados e aceitou partilhar o seu «top 10».
O primeiro lugar pertence a O BOM, O MAU E O VILÃO, de Sérgio Leone.

Segue-se um outro
western «Rio Bravo», e «Blow Out», filme de Brian de Palma. O quarto lugar é de «Taxi Driver», de Scorsese, seguidos da paródia «O Grande Escândalo», a obra oriental «5 Fingers to Death», «A Caixa de Pandora», a obra de terror «Carrie», «Odeio-te Meu Amor» e o subtil filme de guerra de Billy Wilder «Cinco Covas no Cairo».

19 de dezembro de 2008

OS MEUS POSTERS: Imperdoável
























IRA.
Uma boa notícia deste final de ano acinzentado pela crise: a Cinemateca está a dar o destaque que Clint Eastwood merece. Recordar a sua carreira ao detalhe é percorrer algumas das melhores memórias de Hollywood. E IMPERDOÁVEL é daqueles clássicos que ficam...

15 de dezembro de 2008

CINEFILIA: As cinco promessas de Dezembro





SOBERBA.
Mês de Natal não é sinónimo de estreias pomposas, até porque os filmes que mais se aproximam das principais categorias para os Óscares e outros festivais de peso só chegam a Portugal lá mais para a frente... O que sobressai na colheita pré-natalícia é muito bom cinema de autor, uma recomendável animação e o esperado regresso de Baz Lurhmann.

-EU QUERO VER: Um documentário peculiar é o que se pode dizer deste filme feito a meias entre Joana Hadjithomas e Khalil Joreige. É através do olhar amadurecido de Catherine Deneuve (que se interpreta a si própria) que se tenta descortinar mais o conflito do Médio Oriente. Uma certeza: a tensão impõe-se, numa guerra sem fim à vista.

-FOME: Já é dos filmes mais elogiados deste ano este trabalho do artista plástico com um nome que nos traz outras recordações - Steve McQueen. O duro retrato de uma prisão no Norte da Irlanda recorda a greve de fome do IRA em 1981. O cinema faz-se à custa da dor.

-AUSTRÁLIA: Chega lá mais para o final do ano este regresso muito esperado do realizador de «Moulin Rouge». É certo que é um épico de fortes convicções - predominam as alusões a «E Tudo o Vento Levou» - e até tem um casal sonante. Mas há quem defenda que este novo filme de Nicole Kidman e Hugh Jackman pode ser uma das grandes promessas falhadas deste final de ano. Será?

- QUATRO NOITES COM ANNA: Já estreou em Novembro, mas recomendo este crepuscular filme polaco. É uma história sobre obsessões, muito bela, com o realizador Jerzy Skolimowski a mostrar-nos como o amor pode ser terno e demente. É intenso, da primeira à última cena.

- BOLT: Ligeirinha, esta comédia da Disney (para lá da Pixar...) habilita-se a ser o filme de animação mais interessante deste mês natalício. O segundo «Madagáscar» que se cuide, porque o herói deste 2008 é um cão que esbate com a aventura. Está já nomeado para o Globo de Ouro de Melhor Filme de Animação.

7 de dezembro de 2008

ILUSÕES DE ÓPTICA: Oliveira por Wenders

OS SETE PECADOS DE... Novembro 2008

GULA. É a altura certa para todas as homenagens: os cem anos de Manoel de Oliveira, que se celebram a 11 de Dezembro, já deram origem a um tributo de respeito. A caixa de DVD recentemente lançada, que contém 21 longas-metragens (algumas das quais, nunca antes editadas em formato digital), livros e documentários merece ser vista com toda a atenção. É uma edição de luxo consistente e apropriada, que nos recorda o século de um cineasta, nem sempre bem aceite, mas fundamental para se entender o cinema português desde a sua génese. Uma boa ideia!

SOBERBA. Juntar a voz de Jack White, dos White Stripes, à soul de Alicia Keys pode não ter parecido a melhor das ideias, mas o resultado do tema do último filme de 007, Another Way to Die, é bastante acima da média. E tem um power que assenta como uma luva ao James Bond com cara de poucos amigos de Daniel Craig.

AVAREZA. Com poucos meios, um grande filme. Volto a insistir em «A Turma», o belo filme que se apresenta em jeito de documentário, mas que quer ser, antes de mais, uma poderosa reflexão sobre a escola e o que é aprender. O realizador Laurent Cantet soube filmar este espaço, cenário de muitas mudanças... e polémicas.

IRA. A crítica lançou-se com unhas e dentes a «Ensaio Sobre a Cegueira», de Fernando Meirelles. As acusações de que simplificam demasiado a obra de Saramago, esvaziando-lhe o seu sentido alegórico é inteiramente exagerada. Um filme é um filme, um livro é um livro. E já se tornou fácil criticar as adaptações, dada a densidade de um bom livro que é impossível de recriar em filme. Pois bem, gosto de ir contra-corrente: a nova obra do realizador de «Cidade de Deus» é um poderoso trabalho, muito cuidado tecnicamente e, sim, que faz juz à excelente narrativa semi-apocalíptica de Saramago. É certo que o livro vai muito mais fundo na análise das consequências de uma misteriosa cegueira, mas Fernando Meirelles capta muito bem os lugares turvos da moralidade e os dilemas de uma nova (e perversa) noção de comunidade. Depois, há uma excelente fotografia, um enorme e meritório esforço em ilustrar a cegueira descrita pelo Nobel português e boas interpretações - com particular ênfase para a extraordinária Julianne Moore. Um grande filme, injustamente condenado.

LUXÚRIA. Ao recordar os primeiros filmes de Woody Allen, voltei a deliciar-me com os jogos «orgásmicos» entre Diane Keaton e Woody Allen (entre outros)... num futuro «já algo nostálgico», em que o prazer carnal surge ao carregar num botão. Hilariante!

INVEJA. Um CD adquirido recentemente compila a música dos muitos filmes de Pedro Almodóvar. As memórias cinematográficas que as canções nos convocam também remetem para o excelente bom gosto do realizador espanhol. Que usa a música como outra espécie de imagem, além de procurar ir às raízes da «sua» Espanha.

PREGUIÇA. As matinés de fim-de-semana dos canais privados estão cada vez mais sensaboronas. Além de repetições de êxitos que já se viram dezenas de vezes, os ditos canais ainda decidem exibir os referidos filmes contra todas as antevisões anunciadas nas secções de televisão de jornais e revistas.

3 de dezembro de 2008

NA SALA ESCURA: Ensinar a aprender







INVEJA.
«Os professores também têm a sua linguagem e é preciso ver como é que essas duas linguagens, a deles e a dos alunos, conseguem coexistir.» LAURENT CANTER in DN

Numa altura em que a realidade escolar está ao rubro, passou pelas salas de cinema um filme que rompe com os cânones da ficção e do documentário, ao articular as duas realidades num esforço meritório para pensar a escola em toda a sua complexidade.

A TURMA, de Laurent Cantet, é um documento de visionamento obrigatório, por olhar para a realidade do ensino sob o ponto de vista do professor, sem descurar a multiplicidade de linguagens inerentes a alunos à procura de uma identidade
.

Sim, é ficção, mas os actores interpretam-se a si próprios - o professor é mesmo professor, os alunos são mesmo alunos. Além disso, nos muitos atributos deste filme, que arrecadou a Palma D'Ouro, está também uma bonita realização de Laurent Cantet que soube tirar partido da sala de aula como espaço cénico.

É ela o palco para estas figuras se moverem num duelo que se constrói e descontrói todos os dias, enquanto se
procura ir mais longe na vontade de aprender. Sim, todos aprendem. E o professor, vivido por François Bégaudeau, é o primeiro a reconhecê-lo. É do seu olhar que tudo parte e é pelo seu olhar que o espectador percebe que a escola é um lugar delicado. Onde se fazem pessoas e cinema. A sétima arte anda aqui de mãos dadas com uma noção genuína de serviço público.

Sim, esse conceito difuso e polémico encaixa aqui na perfeição. Como numa equação matemática.


Outra crítica AQUI

A TURMA
De Laurent Cantet (2008)
* * * *

É já um dos filmes do ano, este olhar realista para o universo da escola. Para lá da sua forma documental, está uma génese ficcional bem urdida, com excelentes enquadramentos, diálogos ajustados e um sentido de denúncia social. Devia ser exibido em todas as escolas. Talvez as fiquemos a entender melhor...