31 de março de 2008

OS MEUS POSTERS: Cão Danado

























GULA.
Na recente ida a Londres, vim com um «pack» de clássicos de Akira Kurosawa. Resultado? Descobri o thriller CÃO DANADO, uma interessante viagem pelo submundo do crime, com um polícia a querer saber onde foi parar a sua arma roubada. O estilo é dinâmico e revela arrojo na forma de mostrar um Japão obscuro, mesmo que a preto e branco.

29 de março de 2008

O QUE AÍ VEM... El Orfanato







IRA.
«Seria um 'cliché' dizer que, por ser mexicano, consigo ver a morte de uma certa maneira.» GUILLERMO DEL TORO

O dom para as alegorias, a bela plasticidade visual (a lembrar Tim Burton ou Peter Jackson, por exemplo) ou o engenho na construção de planos tornaram Guillermo Del Toro a coqueluche dos realizadores fora de Hollywood que se convertem aos seus padrões sem abdicarem de um importante sentido criativo.

A culpa foi de «O Labirinto do Fauno», obra de tal forma importante que permitiu ao seu realizador ser apontado como o responsável pela adaptação de «Hobbit», a obra mais desejada depois da reverência com a trilogia de «O Senhor dos Anéis», também de Tolkien. Antes disso, Del Toro foi também adquirindo espessura enquanto produtor e é ele que está por trás de um dos mais badalados filmes espanhóis dos últimos meses.

EL ORFANATO, co-produção entre Espanha e México, é uma obra de terror intimista a fazer lembrar, por exemplo, «Os Outros», de outro realizador latino, Alejandro Aménabar
.

A premissa deste conto negro, que tem acumulado cinco estrelas em inúmeras revistas de cinema? Trata-se do regresso de uma mulher ao orfanato onde fôra criada, com o intuito de o reabrir. O cenário adensa-se quando o seu filho cria um amigo imaginário, capaz de causar calafrios.

O realizador Juan António Bayona esforça-se por actualizar o tom de fábula de terror, à maneira clássica, sem necessitar de derramar muitos litros de sangue. Depois, diz quem viu, que o maior mérito da obra é a forma como a história é contada, capaz de reabilitar o mito da casa assombrada. Aquela em que ninguém quer morar, mas da qual não se consegue resistir a ir dar uma espreitadela. O mundo continua misterioso nas mãos de Guillermo Del Toro.

A ilusão da fama faz-se com figuras de cera







SOBERBA.
«A perda do anonimato é algo para o qual ninguém consegue estar preparado. Quando aconteceu, percebi que tinha perdido uma das coisas mais valiosas da minha vida.» HARRISON FORD

Londres, domingo de Páscoa de 2008. O frio é tanto que começam a cair flocos de neve nas ruas cinzentas, que competem a tonalidade com nuvens autoritárias. Logo pela manhã, o destino é só um: ir ao museu Madame Tussaud, ver as estrelas de perto.

Ou melhor: pousar para a fotografia com simulacros de cera, numa jogada pouco racional e reflexo do poder imenso da fama. De todos os museus londrinos, este é o mais caro, o mais lotado e... o mais irresistível. Porquê? Porque se cria um entusiasmo quase infantil de quem quer ver a história dos famosos em modelos palpáveis, mas profundamente vazios e sem sentido.

Será que todos queremos ser famosos? Não direi tanto, mas todos gostamos de partilhar referências, sentir que o nosso imaginário é semelhante ao do vizinho, trazer memórias ao de cima quando se vê o boneco de Hitchcock, o James Dean em pose célebre, o vestido branco de Marilyn a esvoaçar como em «O Pecado Mora ao Lado».

Depois há aquelas fotografias «obrigatórias»: encenar um olhar sedutor, enquanto nos colocamos ao lado de Humphrey Bogart, criar uma pose de herói de acção a escassos milímetros de o Homem-Aranha ou Jack Sparrow, inventar uma pose cool e fingirmos sermos personagens de «Pulp Fiction», com Samuel L. Jackson logo ali...

No final o que sobra: uma imensa sensação de estarmos a submergir ao lado pimba da cultura, mas no fundo deixarmo-nos envolver pelo fenómeno pop que nos rodeia de uma ou outra forma. E esse lado mediático não se inscreve só no cinema, o que torna tudo mais interessante: estão lá representados símbolos da música, do desporto (José Mourinho, logo à entrada da secção...), da política ou da ciência.

Foi a segunda vez que entrei no museu das celebridades, com um intervalo de uma década. E o que constatei: além da inserção de um simpático filme de animação a três dimensões, o espaço tem caras novas. Sim, porque ser famoso pode não ser para toda a vida (a grande maioria das vezes não o é)... E isso é tanto mais perverso quanto a vontade de tocar numa réplica do nosso herói favorito.

Há dez anos, a figura mais concorrida era Arnold Schwarzenegger. Hoje, o casal Brad Pitt e Angelina Jolie. Sinal dos tempos... gelados como as ruas de Londres neste domingo de Páscoa.

26 de março de 2008

NA SALA ESCURA: As entranhas da América







IRA.
«Ainda não percebi: tu queres ser como eu ou tu queres ser eu?» JESSE JAMES (Brad Pitt)

Costuma dizer-se que dos fracos não reza a História. No entanto, pode ajudar a criar estrondosos filmes, como é o caso de duas das mais elogiadas obras deste início de ano, que têm em comum o facto de trazerem consigo personagens à deriva e dois perdedores em particular: no caso de O ASSASSINATO DE JESSE JAMES PELO COBARDE ROBERT FORD é a personagem de Casey Affleck que assume esse estatuto, ao dar vida ao ambíguo homem obcecado pela figura de um anti-herói norte-americano, procurado por toda a América, quando no fundo ninguém o queria encontrar - em nome do mito...

O que é certo é que Robert Ford quer fazer-se homem à sua imagem, ou melhor à sua sombra, negligenciando a autonomia. A obsessão termina em morte, mas rapidamente o «cobarde» vai perceber que é incapaz de aniquilar um pedaço de história e rebeldia norte-americana, num soberbo exercício que Anthony Dominik criou nesta espécie de western crepuscular. Assim, o que Robert Ford ganha é a imensa solidão dos figurantes da história, numa presença obnubilada pela própria ambição de querer competir com um mito.

Já em ESTE PAÍS NÃO É PARA VELHOS, o regresso à grande forma dos Irmãos Coen que lhes valeu o Óscar de Melhor Filme e Realiza
dor, a figura do loser é a de Josh Brolin, o pacato Llewelyn Moss, que sonha com a fortuna quando se depara com uma mala cheia de dinheiro e alguns cadáveres em volta.

No instante em que decide levar o objecto consigo, a personagem acaba por assinar a sua sentença de morte, mesmo que esta só surja no final desta impressionante obra descodificadora das noções de suspense. A morte, essa, vem personificada no assombroso retrato que Javier Bardem faz de um assassino de estranho corte de cabelo e sem pudor em puxar o gatilho.

O que estas duas obras comprovam é que, por um lado, está instalado no cinema a
mericano uma aura negativista, um receio de quebra do bem face ao mal, com direito a erosão de valores e doses generosas de nostalgia - talvez por isso estes dois filmes pareçam fragmentos actualizados dos velhinhos westerns, com uma dose extra de desfaçatez.

Por outro, são um sinal claro que o cinema de autor não tem de vir maioritariamente da Europa. Em nome da diversidade, a América parece tê-lo redescoberto.

O ASSASSINATO DE JESSE JAMES PELO COBARDE ROBERT FORD
De Anthony Dominik (2007)

* * * *

O filme esteve paralisado longos meses e suspeitou-se que vinha aí fiasco. Nada mais errado: além de um importante olhar melancólico sobre o Oeste, este drama é também uma outra visão (muitíssimo bem filmada) sobre o mito de Jesse James. E para os seus pés de barro. Com boa fotografia e dinâmica envolvente, o filme tem a sua força motriz nos grandes desempenhos de Brad Pitt e Casey Affleck (nomeado para o Óscar).

ESTE PAÍS NÃO É PARA VELHOS
De Joel e Ethan Coen (2007)

* * * * *

Onde tem estado o cinema dos irmãos Coen nos últimos anos? Esta tem sido a pergunta repetente dos críticos, para tentar perceber-se como foi possível só agora nos lembrarmos do talento desta dupla para criar filmes negros de excepção. Já o sabíamos com
Histórias de Gangsters, Blood Simple ou Fargo, mas este parece ser um dos seus pontos mais altos em muitos anos. Não só por dar novo fôlego aos filmes de golpe, mas por criar um certo olhar de desadequação face ao presente, que ajuda à aura de clássico esperada. As figuras de Josh Brolin, Tommy Lee Jones e Javier Bardem (vencedor de um Óscar) são opostas mas complementam-se. Um triângulo que nos ajuda a perceber as diferentes motivações de quem luta pela sobrevivência. Obra-prima.

20 de março de 2008

QUIZ: O que têm em comum estes filmes?








Regresso à fórmula anterior de passatempos, da qual já nutro saudades. As críticas que este modelo recebeu só aumentaram a vontade de regressar a enigmas em que, mais do que as imagens, reina a ambiguidade.
Solução do QUIZ anterior: trata-se de CONGO (1995), de Frank Marshall.

A Páscoa ainda é o que era








SOBERBA.
«Um adulto conhece o mundo em que vive. Neste momento, esse mundo é Roma.» Pontius Pilate (Frank Thring in BEN-HUR)
O cenário repete-se: em período de Páscoa nada como preencher as tardes televisivas com épicos grandiosos que nos ajudam a entender a mensagem cristã.

Este ano não há nenhuma «A Paixão de Cristo» nos cinemas e apenas podemos recordar a polémica no canal MOV, esta sexta-feira a partir das 22h30. O que é certo é que a obra de Mel Gibson teve o mérito de colocar o mundo a discutir-se enquanto crente, olhando de uma forma comprometida para um filme que pode não ter grandes méritos cinematográficos (apesar da boa fotografia e dos desempenhos aceitáveis), mas que «mexeu» um pouco com convicções.

Desde aí, o cinema de pendor religioso tem estado retraído, talvez porque os grandes estúdios receiem cada vez mais que religião não vende... - algo que Mel Gibson soube sabiamente contrariar.

O que é certo é que em cada Páscoa regressam à tona os mesmos filmes, o mesmo sentido do cinema comercial grandioso, mas um cinema que já não existe. Feito de cenários que hoje seriam rapidamente substituídos por píxeis, orçamentos de outro mundo e durações impensáveis...

Ainda assim, já há saudades de rever BEN-HUR, talvez o maior e mais perfeito clássico desta época
, que a RTP1 repesca para a matiné de domingo.

A jornada de vingança de Judah Ben-Hur (saudoso Charlton Heston) já todos conhecemos de cor, as competições na arena também, os prémios acumulados «idem idem aspas aspas» (recebeu 11 Óscares, tantos apenas como «Titanic» e «O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei»). E depois? É sempre revigorante testemunhar o músculo do cinema para encenar um espectáculo em larga escala.

19 de março de 2008

OS MEUS POSTERS: 2001, Odisseia no Espaço

























IRA.
A semana negra continua, com a morte anunciada do escritor Arthur C. Clarke, mas este já «bem velhinho» nos seus 90 anos. Por isso, numa homenagem, nada como lembrar os segredos insondáveis que se escondem em 2001: ODISSEIA NO ESPAÇO, ou a forma ardilosa como Kubrick dissecou a ficção científica.

O cinema insiste em ficar mais pobre







SOBERBA.
«Existem heróis, mas as suas motivações nunca são heróicas.» ANTHONY MINGHELLA

Se o cinema fosse um tabuleiro de xadrez, o realizador Anthony Minghella seria um bispo. Não só pela sua presença discreta, como pela tonalidade clássica da sua obra. Além disso, era um cineasta altamente competente, absolutamente crente na sua forma de fazer cinema e eficaz no modo de captar emoções.

Não se movimentava em linha recta, mas preferia conduzir a carreira pacientemente, fazendo-se notar sempre que um novo filme chegava às salas.

O cinema insiste em ficar mais pobre e, neste caso, perde em histórias bem dirigidas, quase sempre marcadas por um sopro romântico que já pouco se coadunava com o nosso tempo
.

Talvez fosse algo conservador, mas no melhor que o termo pode oferecer. Quem se recorda das belas imagens de «O Paciente Inglês», da comédia de afectos de «Um Fantasma do Coração» ou da jornada de contornos épicos de «Cold Mountain» sabe o que o britânico Anthony Minghella podia dar ao cinema comercial, elevando-o à sua condição de quase transcendência.

Não era um realizador ambicioso, transfigurador do que já existe. Não. O seu cinema era moldado por uma certa nostalgia visual e, por isso, dificilmente será esquecido.

15 de março de 2008

CINEFILIA: As cinco promessas de Março







GULA. Ainda não vi «Este País Não É Para Velhos» nem «Haverá Sangue». No entanto, o ritmo de estreias, embora pareça ter aligeirado um pouco, continua a assentar na diversificação. Registe-se que a maior parte do cinema de autor já se estreou a tempo dos Óscares, pelo que é um cinema mais marginal (ou absurdamente comercial) que se encontra agora nas salas escuras. Março já vai a meio, mas há ainda coisas para ver...

- LOBOS: A proposta de José Nascimento parece interessante e, pelo menos, tem o mérito de mostrar que o cinema português continua a mexer. Ainda que pouco. Esta é uma história de personagens em fuga, com um homem a escapar-se ao lado da sobrinha, depois da morte do irmão. A ambiguidade na relação entre ambos parece ser a mais-valia.

- THE LOVEBIRDS: Um pequeno e curioso «OVNI», não só por ser realizado por Bruno de Almeida (há muito radicado nos Estados Unidos), mas também por querer assumir-se como uma obra luso-americana, de personagens em registo confessional. Passam por aqui Ana Padrão, Michael Imperioli ou Fernando Lopes. Produção?... Joe Berardo!

- CARAMEL: Cinema sensível, dirigido e protagonizado por Nadine Labaki. É também uma boa oportunidade para se perceber que no Líbano também há quem se deixe seduzir por imagens em movimento. Premissa? Em Beirute, cinco mulheres reúnem-se frequentemente num salão de beleza, um microcosmos colorido onde se partilham histórias.

- I'M NOT THERE - NÃO ESTOU AÍ: Absolutamente obrigatório, ou não fosse mais uma obra pouco convencional de Todd Haynes com a peculiaridade de contar a história, o génio, a poesia de Bob Dylan, recorrendo a um interessante naipe de actores: desde Cate Blanchett (nomeada para o Óscar) a Richard Gere, Christian Bale ou o recém-falecido Heath Ledger. O cinema independente norte-americano continua pródigo em novos desafios temáticos.

- THE MIST - NEVOEIRO MISTERIOSO: Passou pelo Fantasporto e, apesar de poder ser uma enorme desilusão, dá-nos a esperança de pensar que o cinema de terror ainda goza de boa saúde. Na realização está Frank Darabont, capaz de muito bom («Os Condenados de Shawshank») e de muito mau («À Espera de um Milagre») ao pegar na obra de Stephen King.

QUIZ: A que filme pertence esta imagem?









Para concluir esta singela homenagem à presença de gorilas, macacos, chimpanzés e afins no cinema, deixo uma última imagem a apelar à memória. O facto do filme ser mau, e facilmente relegado nas recordações cinéfilas, complica tudo...


Solução do QUIZ anterior: Era, efectivamente, uma imagem do filme ROUNDERS - A VIDA É UM JOGO. Um interessante encontro entre Matt Damon, Edward Norton e um memorável John Malkovich que, no entanto, quase passou despercebido...

14 de março de 2008

O MAIOR PECADO DE... Tim Burton








PREGUIÇA.
«Enquanto 'Eduardo Mãos de Tesoura' não podia ter vindo de outra mente criativa, este filme poderia ter sido dirigido por um qualquer realizador de acção» in LOOKING CLOSER

Já que estamos a falar de símios, e numa altura em que «Sweeney Todd» é ainda uma boa recordação recente, nada como lembrar o ponto fraco da carreira de uma das mentes mais retorcidas e frutuosas do cinema comercial.

Que não restem interrogações: Tim Burton é um cineasta na amplitude do conceito, quer pela capacidade intrínseca em desenvolver ambientes, quer pela aproximação do cinema ao poder expressionista do imaginário fantástico, de contornos góticos, onde há sempre árvores de ramos fantasmagóricos, personagens com a palidez digna de um morto-vivo e, na melhor das hipóteses, mais um desempenho idiossincrático de Johnny Depp.

O que é certo é que 2001 foi um ano difícil para os Estados Unidos e para a carreira de Tim Burton que, na sua maré revisionista, se lembrou de ir pegar no conto futurista de Franklin J. Schaffner, o memorável «O Homem Que Veio do Futuro».

Ou melhor, o modelo da ficção-científica com neurónios, que fez todo o sentido na altura da sua estreia, em 1967, mas que ficou cristalizado no tempo - nem as suas sequelas lhe fizeram a mínima sombra... Não é que o facto de Tim Burton decidir refazer uma obra de potencial cinematográfico seja um problema. Parece até, observando «Charlie e a Fábrica dos Chocolates» ou o recente «Sweeney Todd», que quanto mais intocável é o produto original, maior é o desafio que Tim Burton se coloca a si próprio.

O que se passa é que em PLANETA DOS MACACOS há uma gigantesca ausência de marca autoral em toda a história. O filme começa já cansado
, com um protagonista pouco expressivo (Mark Wahlberg mal se distingue em relação aos restantes símios...) e até os macacos não causam o assombro do filme original. Burton requisitou Tim Roth, Helena Bonham-Carter ou Paul Giamatti para se submeterem a dolorosas horas de maquilhagem, mas nenhum deles sobressai para lá das orelhas e do focinho de macaco.

Qualquer tentativa de obter uma réstia de emoção é vã e ninguém parece querer realmente saber em que planeta está o astronauta de Wahlberg ou por que razão os símios insistem em tratar os humanos como animais.

Se, por um lado, já conhecemos a história de cor, por outro esta nova versão raramente ultrapassa a mediania de um vulgar filme de aventuras. Nem a presença bela (e quase sem palavras) de Estella Warren chega para confortar...

Quanto ao badalado final, quando chega já nós estamos perdidos entre bocejos. Macacos me mordam: ainda bem que Tim Burton não demorou a acordar deste inconsequente e caro pesadelo!


Críticas de fugir:
- CINEMA 2000: É, claramente, um Tim Burton «menor», que, mais selvajaria menos selvajaria, está demasiado preso à iconografia (até à cenografia) marcada pela versão de Franklin J. Schaffner.

- ENTERTAINMENT TODAY: «Planeta dos Macacos» tem macacos que falam, sim, mas parece que não percebeu nada do comportamento humano, comportamento primata ou o que quer que ele queira passar.

- E-FILMCRITIC.COM: Mark Wahlberg não é Charlton Heston e a Estátua da Liberdade nunca chega a fazer a sua aparição.

6 de março de 2008

Os 75 anos da oitava maravilha do mundo







IRA.
«Foi a bela que matou o monstro.»
A efeméride foi no domingo e assinalada com um concurso de gritos e a projecção do filme que o tornou famoso em Nova Iorque: King Kong, apelidado de «A Oitava Maravilha do Mundo» fez 75 anos. E continua bem vivo na memória, com uma ajuda de Peter Jackson que actualizou o culto há um par de anos com uma versão em jeito de upgrade tecnológico.

Em 1933 KING KONG tornou-se um mito colectivo, um sucesso sem precedentes que colocou, de uma vez por todas, a fantasia e o terror como géneros ambiciosos e potencialmente lucrativos.

Hoje, continua a ser olhado como o filme de monstros mais importante do cinema quer pelo ritmo alucinante para a época, quer pela reconversão da fábula de A Bela e o Monstro, numa estranha obsessão entre um gorila pré-histórico e uma lendária e estridente actriz (Fay Wray, a screem queen dos anos 30, falecida em 2004).

Os custos de produção chegaram aos 670 mil dólares, um valor elevado para uma época de contenção. O estúdio independente RKO Pictures (responsável por outras pérolas como «O Mundo a Seus Pés», de Orson Welles) estava à beira da falência e colocou o seu futuro financeiro nas mãos dos realizadores Merian C. Cooper e Ernest B. Shoedsack.

Quando se estreou, KING KONG foi o primeiro filme a ser exibido simultaneamente nas principais salas de cinema dos Estados Unidos.

Num só dia, 50 mil pessoas assistiram fascinadas a um universo lendário carregado de criaturas bizarras que estendiam os horizontes da ficção até ao limite. O resto é história, com a devida dose de lenda...

Segundo consta, quando a indústria do cinema ainda lutava contra os efeitos devastadores do crash financeiro de 1929, Merian C. Cooper, ao ter a ideia de criar «a Oitava Maravilha do Mundo», chamou ao seu escritório Fay Wray, já experiente nas lides do cinema de terror, para lhe dizer que iria contracenar com «o actor mais alto e moreno de Hollywood».

Perante a estrela, que acabou por ficar para sempre ligada ao êxito desta bizarra história de amor, os adjectivos apontados pelo ex-realizador de documentários só encaminhavam para um actor: nada mais nada menos, do que Cary Grant.

2 de março de 2008

NA SALA ESCURA: O que dá um mês de cinema?








GULA.
«Agora o meu braço está novamente completo» SWEENEY TODD (Johnny Depp)
Nas últimas semanas, as salas de cinema têm estado agitadas. Afinal, é época de prémios e todos querem ver quem segue na linha da frente dos Óscares.

Até ver, e tendo em conta que me faltam os novos filmes dos Irmãos Coen e de Paul Thomas Anderson, pode-se dizer que a colheita é recomendável, com multiplicidade de géneros, cinema de autor, recurso a musical, sátira política ou comédia de travo independente
(sim, «Uma Família À Beira de um Ataque de Nervos» encontrou um digno sucessor em JUNO!).

Este foi um mês de experiências cinéfilas dedicado exclusivamente ao cinema anglo-saxónico, mas já há saudades de outras cinematografias. As más notícias? É que em Março não se avizinham estreias por aí além. É o costume... depois da temporada forte de estreias, vêm os meses de «seca» até às grandes estreias de Verão.

JOGOS DE PODER
De Mike Nichols (2007)
* * *
A sátira política tem estado algo afastada do grande cinema comercial norte-americano. Por isso mesmo, é de aplaudir este esforço de Mike Nichols em expandir-se no género recorrendo à história verídica do congressista playboy que, contra ventos e marés, consegue avançar com a mais bem sucedida operação secreta da história, que lembra as «várias vidas» das tropas norte-americanas em países do Médio Oriente. Cabe a Tom Hanks viver o lado paródico de Charlie Wilson, negligenciando a sua imagem de herói moral e tornando todo este preenchido modelo dramático num curioso olhar para os telhados de vidro da Nação que se reclama a mais poderosa do mundo. E que raramente se ri de si própria, com a argúcia de um ardiloso argumento que só peca nas caricaturas excessivas das personagens secundárias - sim, tanto Philip Seymour Hoffman como Julia Roberts agarram os seus papéis como podem, mas tanto o agente renegado da CIA como a «socialite» influente não têm um pingo de realismo dramático. Algo que fica bem no tom paródico da obra, mas que a trava nos voos mais sérios.

JUNO
De Jason Reitman (2007)
* * * *
É de longe conhecida a tradição do cinema independente norte-americano. O mais estranho e paradoxal - mas ao mesmo tempo salutar - é pensar que os próprios grandes estúdios têm departamentos dedicados a filmes mais pequenos e a experiências onde o cinema quer procurar novas dramaturgias e uma forma diferente de respirar. É o que se consegue neste trabalho de Jason Reitman, produzido pela divisão Searchlight Pictures da 20th Century Fox, e que tem o mérito de ser o «pequeno grande filme do ano» em matéria de prémios. Porquê? Mais uma vez por uma assombrosa simplicidade, verve apetecível na construção descomplexada das figuras e mascarar um drama humano num conto afável e de forte cariz humanista. Nesta história de uma jovem impreparada para ser mãe, tudo escapa aos chavões das «mães de aluguer» para se dar a conhecer uma menina mais madura do que à primeira vista poderia parecer. JUNO é também uma excelente oportunidade para conhecer o talento de Ellen Page e dar uma segunda hipótese à comédia familiar que é também um desempoeirado olhar sobre a adolescência.

SWEENEY TODD
De Tim Burton (2007)
* * * * *
Tim Burton num... musical? Se o mesmo é passado numa Londres cinzenta e mete sangue a rodos a coisa começa a fazer outro sentido. Pois bem, o realizador de «Eduardo Mãos de Tesoura» parece ter esperado anos e anos para que o seu estilo se encaixasse tão bem numa história, ainda que não original. Burton é infalível no modo como recupera o lado tétrico da obra de Stephen Sondheim e tem tudo no lugar certo: a gestão dramática, a componente plástica das imagens ou o inspirado talento para introduzir a música - às vezes tão cortante como a própria lâmina do protagonista. Depois, há os actores: desde uma sapiente Helen Bonham Carter a um caricatural Sacha Baron Cohen. Já para não falar de Johnny Depp, naquele que será o mais desafiante papel da sua carreira. Com umas impressionantes olheiras. Sim, Depp constrói a complexidade afectiva de Sweeney Todd a partir dos olhos.

EXPIAÇÃO
De Joe Wright (2007)
* * * *
A crítica mais erudita esquartejou este melodrama que é também o filme mais académico na corrida aos Óscares. Talvez esteja a ficar conservador, nostálgico ou menos exigente, mas sinto que esta interpretação do romance de Ian McEwan é um belo exemplo das potencialidades estéticas e dramáticas do grande cinema romântico. A estrutura da obra, a atenção que se dá aos pormenores quer visíveis quer a nível fílmico revelam uma imensa maturidade e um cuidado artístico a valorizar. Pode cair no «dramalhão» que traduz uma história de amor fracassada por uma injustiça, mas é muito mais profundo do que isso no modo como os protagonistas calcam as suas convicções no espectador. Em particular a personagem de Saoirse Ronan, na pele da pequena Briony, um interessante caso a reter. Ainda bem que há espaço para este tipo de cinema. Mais do que tudo, EXPIAÇÃO mostra que ainda é possível contar romances à maneira antiga.

O QUE AÍ VEM... Aritmética Emocional







SOBERBA.
«Não me importa se as personagens são moralmente boas ou más, porque não tenho que gostar delas para as interpretar bem.» MAX VON SYDOW

Devem contar-ser pelos dedos de uma mão os actores vivos que tenham o currículo e a densidade interpretativa de Max Von Sydow. O Padre Merrin de «O Exorcista» ou Anthonius de «O Sétimo Selo» já possui a grandiosidade dos vultos clássicos e foi bom recebê-lo numa justa homenagem no Fantasporto deste ano.

Por cá, dissertou sobre a estranheza de ser actor, desmistificou o método de rodagem de Ingmar Bergman (ao que parece muito mais prático do que a profundidade inabalável que conseguia imprimir na tela) e disse como se consegue surpreender com mais de 130 longas-metragens no currículo.

Entre os seus mais recentes trabalhos, o próximo a chegar às salas nacionais é ARITMÉTICA EMOCIONAL, sobre as vidas de três personagens que vivem para sempre ligadas às memórias partilhadas num campo de concentração da Segunda Grande Guerra.

Obviamente que Von Sidow é um dos veteranos deste melodrama, do desconhecido Paolo Barzman. Pontos a favor? A raiz canadiana da história e o sólido elenco onde se inclui Susan Sarandon, Christopher Plummer ou Gabriel Byrne.

Numa história de cicatrizes, há uma citação que promete ficar no ouvido: «Se me perguntarem se acredito em Deus, sou forçado a responder - e Deus acredita em nós?»

QUIZ: A que filme pertence esta imagem?









Este lacónico espaço tem-me lembrado filmes que quero rever. E às vezes não precisam de ser a preto e branco para confundirem...

Solução do QUIZ anterior: Sim, houve quem acertasse em «A Noiva de Frankenstein, de James Whale.

OS SETE PECADOS DE... Fevereiro 2008








AVAREZA.
Quando se pensa que já se viu tudo, o cinema francês ainda consegue pregar algumas partidas. A descoberta em DVD deste mês foi AMOR SUSPEITO, título português inapropriado para «La Moustache», um estranho caso de esquizofrenia espoletada após um mero corte de bigode. No entanto, a acção delineada por Emmanuel Carrère não é convencional e após as primeiras linhas de paranóia realista, rapidamente desemboca na alucinação com direito a uma incursão pelo Oriente...


INVEJA. A cerimónia dos Óscares foi célere e até mais sólida do que é costume. Senão repare-se: o filme mais académico, o interessante e xaroposo «Expiação», saiu quase de mãos a abanar, deu-se finalmente o Óscar aos Irmãos Coen e os prémios de interpretação somente a actores europeus. Curioso ter premiado «Ultimato» nas categorias técnicas. Enfim, até Jon Stewart coube bem na fotografia, não escondendo as piadas políticas e gozando com a nova condição americana: afinal, além do sangrento «Sweeney Todd», os principais nomeados mostraram Javier Bardem versão «Exterminador Implacável», um melodrama «Expiação» e até um épico «Haverá Sangue». A América parece não hesitar em «mostrar as entranhas»...

GULA. Os DVD continuam a grande altura. Porém, a nova colecção do «Público» tem a sua mais-valia nos livros, 25 excelentes obras que ajudam a perceber por que é que Spielberg já não faz filmes apenas para a criança dentro de nós ou tudo (mas mesmo tudo!) o que Scorsese penou para a Academia se lembrar de lhe dar o Óscar em vida... e não cometer o mesmo erro que fez com Chaplin (agraciado apenas com um prémio honorário) ou com Hitchcock (este ficou mesmo de mãos a abanar...).

PREGUIÇA. Quando o trabalho não abranda de ritmo, o primeiro a ressentir-se é o SIN CINEMA. Por isso, a pausa. Mas a vontade de voltar a escrever foi crescendo. À mesma velocidade com que as estreias de cinema se vão multiplicando nas salas. Alguém consegue acompanhar o ritmo?

IRA. Se James Cameron é um cineasta como Truffaut ou Hitchcock, reconheço que pode ser discutível, mas que o mesmo é de primeira linha em matéria de espectáculo em larga escala, disso tenho a certeza. Foi por isso que me deliciei a rever «A Verdade da Mentira», aquele histriónico filme em que Schwarzenegger faz de espião, dança tango, assiste a uma dança erótica de Jamie Lee Curtis, mergulha no gelo, entra com um cavalo por um hotel a dentro e, uff!, pilota aviões militares por entre os arranha-céus. Falta alguma coisa? Talvez espessura dramática, mas o divertimento está cá todo!

SOBERBA. Tim Burton voltou a acertar no expressionismo com «Sweeney Todd» e contornou os espartilhos do musical. A direcção artística é excelente e Johnny Depp nunca teve uns olhos tão carregados! Mesmo com grandes meios, Burton continua a aperfeiçoar a marca autoral. Excelente!

LUXÚRIA. Não se pode considerar traição, excepto aos olhos da jovem Briony, mas é filmada como tal: a cena de sexo na biblioteca entre as personagens de Keira Knightley e James McAvoy é relativamente intensa, bem filmada e dá um toque mais lascivo a «Expiação».