29 de março de 2008

A ilusão da fama faz-se com figuras de cera







SOBERBA.
«A perda do anonimato é algo para o qual ninguém consegue estar preparado. Quando aconteceu, percebi que tinha perdido uma das coisas mais valiosas da minha vida.» HARRISON FORD

Londres, domingo de Páscoa de 2008. O frio é tanto que começam a cair flocos de neve nas ruas cinzentas, que competem a tonalidade com nuvens autoritárias. Logo pela manhã, o destino é só um: ir ao museu Madame Tussaud, ver as estrelas de perto.

Ou melhor: pousar para a fotografia com simulacros de cera, numa jogada pouco racional e reflexo do poder imenso da fama. De todos os museus londrinos, este é o mais caro, o mais lotado e... o mais irresistível. Porquê? Porque se cria um entusiasmo quase infantil de quem quer ver a história dos famosos em modelos palpáveis, mas profundamente vazios e sem sentido.

Será que todos queremos ser famosos? Não direi tanto, mas todos gostamos de partilhar referências, sentir que o nosso imaginário é semelhante ao do vizinho, trazer memórias ao de cima quando se vê o boneco de Hitchcock, o James Dean em pose célebre, o vestido branco de Marilyn a esvoaçar como em «O Pecado Mora ao Lado».

Depois há aquelas fotografias «obrigatórias»: encenar um olhar sedutor, enquanto nos colocamos ao lado de Humphrey Bogart, criar uma pose de herói de acção a escassos milímetros de o Homem-Aranha ou Jack Sparrow, inventar uma pose cool e fingirmos sermos personagens de «Pulp Fiction», com Samuel L. Jackson logo ali...

No final o que sobra: uma imensa sensação de estarmos a submergir ao lado pimba da cultura, mas no fundo deixarmo-nos envolver pelo fenómeno pop que nos rodeia de uma ou outra forma. E esse lado mediático não se inscreve só no cinema, o que torna tudo mais interessante: estão lá representados símbolos da música, do desporto (José Mourinho, logo à entrada da secção...), da política ou da ciência.

Foi a segunda vez que entrei no museu das celebridades, com um intervalo de uma década. E o que constatei: além da inserção de um simpático filme de animação a três dimensões, o espaço tem caras novas. Sim, porque ser famoso pode não ser para toda a vida (a grande maioria das vezes não o é)... E isso é tanto mais perverso quanto a vontade de tocar numa réplica do nosso herói favorito.

Há dez anos, a figura mais concorrida era Arnold Schwarzenegger. Hoje, o casal Brad Pitt e Angelina Jolie. Sinal dos tempos... gelados como as ruas de Londres neste domingo de Páscoa.