9 de junho de 2008

O amor começa por muitos lados







LUXÚRIA.
«Se amas o cinema, tens de amar a América.» FATIH AKIN

Mais do que um lugar estranho, o amor é um tumulto, um tormento, algo que auto-destrói. A visão é exposta por Fatih Akin neste soberbo HEAD ON - A ESPOSA TURCA, obra que deu nas vistas há um par de anos pelo circuito independente (ao ponto de receber o Leão de Ouro do Festival de Berlim) e que apenas descobri há coisa de uma semana. Ao ponto de ficar rendido instantaneamente à capacidade do realizador alemão em prender e surpreender pela expressividade das suas imagens.

Esta absorção há muito que não se verificava e pode ser explicada pela convulsão de duas personagens que vivem no ponto máximo dos afectos e começam o amor pelo fim. Ou melhor, a peripécia emocional deste conto muito negro é que os dois turco-alemães da história conhecem-se na fase mais vulnerável das suas vidas - numa clínica de reabilitação, depois de tentarem o suicídio -, mostram-se logo inteiros um ao outro, casam-se por conveniência e, só a partir daí, começam a redescobrir a inocência.

Cahit (Birol Unel) é um alcóolico auto-destrutivo que procura esquecer a morte da primeira mulher, ao passo que a bela Sibel (Sibel Kekilli) apenas sonha em poder escapar-se do conservadorismo da sua família. De início tudo corre sobre rodas, e Sibel acaba por ser uma lufada de ar fresco na vida desmoronada de Cahit. Com o que ambos não contavam, era que o amor iria floscerer na maneira convencional e genuína de o ser, quando ambos estavam preparados para viver a vida em contraciclo.

Sim, a mais-valia e o assombro de HEAD ON - A ESPOSA TURCA está na inversão moral destas personagens, perdidas num mundo que parece não estar disposto a acolhê-los.

Oscilantes entre a tradição turca e a frieza alemã, o casal desfaz-se e sente na pele a força do «amor cão». É disso que se trata: sentir na carne o poder dos sentimentos. Lutar, sofrer, morrer e nascer outra vez, insistir. Tudo em nome de um afecto que vicia. Como o álcool, a cocaína, o sexo. Os dois perdedores desta história jamais poderiam ter um final feliz. São maiores do que isso. Maiores do que a ordem das coisas, incapazes de seguirem os carris auto-impostos pela sociedade. A evasão torna-os maiores do que a vida.

Por isso a queda será igualmente gigantesca. Com uns condimentos orientais, Fatih Akin mostra que é um dos mais jovens promissores europeus e faz-nos acreditar que a vida tem de ser levada com intensidade.

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