24 de novembro de 2006

NA SALA ESCURA: A última tentação de Scorsese

Martin Scorsese deixou um aviso: Entre Inimigos será a sua derradeira grande obra, ou melhor, a sua super-produção ao sabor dos caprichos de uma indústria que ainda não o soube compensar com aquilo que já lhe é de direito há um bom par de filmes: a estatueta dourada para Melhor Realizador. Será desta? A questão fica no ar e faz sentido porque esta obra, que representa o regresso de Scorsese ao universo de "gangsters" tem o condão de um trabalho sólido de autor: o enredo elaborado, os planos criativos, as reviravoltas necessárias para manter o interesse ao longo de mais de duas horas e meia e... um encontro há muito esperado. Não, não é o "frente-a-frente" entre Leonardo DiCaprio (sucessor de DeNiro como protagonista das obras mais recentes do cineasta) e Matt Damon. É antes o cruzamento de talentos (como é que nunca ocorreu antes?!) entre Scorsese e Jack Nicholson. Esta dupla faz faísca, não só porque Scorsese percebeu que Nicholson é o contraponto necessário à dupla de infiltrados, como o próprio actor parece deixar-se ir nos caprichos da sua inesgotável fonte de criatividade dramática. A sua personagem é digna de antologia no género de filme de "gangsters" e engrandece uma obra que, embora se trate de um "remake", consegue ter alma própria e um pulsar genuíno para uma proposta de novo cinema de autor. E nunca Scorsese foi tão negro. Será que é desta o Óscar? Nicholson pode já preparar mais uma garantida nomeação...

Pecado do Dia: Ira
Apesar da acção de Entre Inimigos ser em Boston, o dedo mágico de Scorsese para contar uma intrincada história de falsos polícias e criminosos mantém a mesma convicção e verve narrativa dos bons tempos de Tudo Bons Rapazes. Esta nova incursão pelo universo do crime, despojada dos artifícios e excesso de meios explorados nas duas anteriores obras do cineasta, revelam que o âmago de "contador de histórias" negro se mantém inalterado e o jogo de golpes e contragolpes segue a sua missão com grande eficácia. As personagens de DiCaprio (esforçado, no mínimo) e Damon (excelente composição mais perversa do que o costume) caminham pela dicotomia não só de posição face à lei mas enquanto elos identitários. Nesta cadeia de personalidades ambíguas, há ainda um Nicholson como vilão perfeito e uma mulher (Vera Farmiga) envolvida nos dois pólos que configuram o peso central de Entre Inimigos. Tudo bate certo até o final inesperado. Embora reincidindo em temáticas já por diversas vezes exploradas na sua carreira (e de partir de uma base dramática que, para todos os efeitos, não é sua), Scorsese voltou aos velhos tempos e mais profundo e complexo do que nunca. * * * *

3 comentários:

emot disse...

És um pecador, deverias ter dar dado 4,5/5 ao The Departed. Estás perdoado, mas apenas porque o filme é um remake... :P

Anónimo disse...

Gostei de "The Departed", mas não acho que o Scorsese tenha, ou alguma vez vá, voltar aos velhos tempos.

Gostava que fosse assim, vamos esperar para ver...

Cumprimentos

home design disse...

graet post, keep posting