27 de setembro de 2008

OS SETE PECADOS DE... Setembro 2008








IRA.
Num mês que foi, acima de tudo de férias, a jornada pelo Chile não esteve isenta de cinema. Além do assombro de um país que parece feito de vários países (tal é a heterogeneidade das suas paisagens, das suas gentes, do seu fabuloso património cultural), o que mais espanta são os quase cinco mil quilómetros que distam do norte ao sul. Com a ambição de o querer conhecer de ponta a ponta em duas singelas semanas, não houve outra hipótese além da de passar longas jornadas dentro de um autocarro. A boa notícia é que o Chile possui um bom serviço de transportes, a má é que nem sempre trata bem os filmes que exibe durante longas jornadas que podem superar as 24 horas. Numa destas viagens, o assistente de serviço insistiu em colocar filmes de terror em série, ignorando o olhar de desconforto de menores mais sensíveis. Ainda assim, a insistência permitiu-me descobrir a bela alegoria que é NEVOEIRO MISTERIOSO, a obra de terror apocalíptica de Frank Darabont. A premissa delineada por Stephen King, que isola um grupo de aterrorizadas personagens num supermercado, enquanto lá fora nada se vê mas sabe-se que o pior está para acontecer... É na gestão do «suspense» e no cuidado como o realizador gere a tensão psicológica que está um dos pontos fortes desta obra, meticulosa até na forma como revela com cuidado os indícios «sui generis» de uma ameaça inexplicável. É aqui também que despertam os ódios e os fanatismos ao ponto do terror estar mais presente na essência humana do que na ameaça desconhecida. Um filme de arrepiar, que faz ainda acreditar no poder do susto. A contenção joga a favor deste trabalho, que nem o excessivo final consegue comprometer.


GULA. O regresso fez-se também de uma vontade de experimentar coisas novas no SIN CINEMA. Houve mais uma tentativa frustrada de largar o projecto, mas a consequência que perdurou foi a de querer reforçá-lo ainda mais. Com um acompanhamento mais frequente. Que se tirem conclusões...

AVAREZA. Sou daqueles que duvidou da estatueta dourada entregue a Nicole Kidman por «As Horas». Não que duvide do seu imenso talento, mas porque nesse filme o nariz postiço parecia dar demasiada ajuda para um desempenho que perde em comparação aos de Meryl Streep e Julianne Moore nesse mesmo trabalho. Porém, tirei as dúvidas em «Margot e o Casamento», um melodrama de actores, de Noah Baumbach, que os interessados em cinema norte-americano de travo independente reconhecem de «A Lula e a Baleia». Ora, o novo filme - que não chegou injustamente aos cinemas! - é uma pérola sobre como uma família se pode fragmentar em nome de personalidades que, pura e simplesmente, colidem. Kidman é a Margot do título, mulher dúplice, às turras com a irmã (excelente Jennifer Jason Leigh) que está prestes a casar com um homem patusco e até ingénuo (excelente Jack Black). Quando os traumas disparam e o drama se instala, Kidman mostra o seu empenho dramático num papel que é perfeito pela natureza intimista. No fundo, é um retrato dorido dos laços familiares, muito bem dirigido e que é tão forte que opta por prescindir de banda sonora.

SOBERBA. Com os seus defeitos e qualidades, a revista britânica «Empire» voltou a eleger os melhores filmes de sempre. A lista agora envolve 500 filmes, dá o primeiro lugar a «O Padrinho», de Francis Ford Coppola (o que é de saudar...), mas comporta uma impressionante surpresa: dá a escolher ao leitor que capa quer levar no meio de cem diferentes impressas. É obra! É um sinal de ambição, bom gosto e revela atenção de que o futuro passa pela personalização.

INVEJA. Já que se fala de revistas, saúde-se igualmente o regresso anunciado da portuguesa «Premiere» que vai voltar às bancas em Outubro. Com uma tiragem de 20 mil exemplares, a revista que lutou contra a corrente oito anos no mercado nacional foi ressuscitada depois de um fim abrupto e inexplicável. Esperemos que regresse melhor, com vitalidade e pronta para encarar os tempos que se avizinham. Bem-vinda, outra vez.

PREGUIÇA. Continuo distante da sala escura por cansaço, agenda preenchida e vontade em explorar o cinema em casa. Mas prometo inverter a situação...

LUXÚRIA. Os jogos de infidelidade de «Short Cuts - Os Americanos» merecem ser lembrados, dada a minúcia como Robert Altman desconstrói os afectos. Vermos Tim Robbins a trocar Madeleine Stowe por Frances McDormand tem graça e este é apenas um dos nós do gigantesco novelo de um filme que é o reflexo de uma certa forma de viver «à americana». Mas mais perto da realidade portuguesa do que seria de prever. Grande filme!

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