16 de fevereiro de 2009

NA SALA ESCURA: A nova cidade de Deus


AVAREZA. «Este é o nosso destino.» Jamal Malik (Dev Patel)

Quem nada tem, não tem nada a perder, parece-nos gritar o realizador Danny Boyle com o seu estilo agressivo e hiperdinâmico neste delicioso QUEM QUER SER BILIONÁRIO?

A obra transformou-se no feel good movie do ano e por mérito próprio. Contém uma energia à prova de bala (que é como quem diz dos ponteiros do relógio...) e uma mensagem positiva mesmo no meio do caos e dos contrastes de Bombaim. Nessa noção simples (que se esforça por não ser simplista) de exaltação do amor mesmo quando tudo à volta não faz sentido ou parece ir contra o rumo dos protagonistas, o filme tem ganho adeptos em todo o mundo.

Por isso mesmo, pode ter alguma graça se o virmos a fazer «mossa» na próxima entrega dos Óscares, até porque seria um modo de Hollywood compensar uma série de filmes independentes que, por diversos motivos, têm estado arredados das categorias principais.

«Quem Quer Ser Bilionário?» tem uma frescura que já conhecíamos de outros trabalhos de Danny Boyle, mas o realizador raramente esteve tão concentrado numa motivação como neste caso, pelo que é bom ver que a consagração existe finalmente, e largos anos depois de «Trainspotting». É certo que teve o desaire de «A Praia» e os filmes que ninguém viu, como «Milhões», mas o seu dom para criar é inegável.

E é isso que volta a fazer neste conto que oscila entre o hiperrealismo e a fantasia pura de quem quer seguir um sonho. A sua câmara é desenvolta, surge nos sítios mais inesperados, constrói enquadramentos impensáveis e cola-se às figuras que são a alma desta história.

Depois, há um argumento genial, assente na premissa de articular um concurso com as circunstâncias que levam alguém a saber as respostas ao quiz que é proposto.

No final, «Quem Quer Ser Bilionário?» conquista até o mais adormecido dos espectadores com a sua vontade em impor-se enquanto jornada pelo lado bom e mau de um país de contrastes. Neste ponto, vêm à memória muitas cenas de «A Cidade de Deus», seja na articulação das narrativas, seja pela visão de muito perto da pobreza.

Estas referências, bem como algum facilitismo na exacerbação dos sentimentos ou na construção do perfil das personagens centrais, reduzem o lado inventivo de «Quem Quer Ser Bilionário?». Mas mais uma vez a sua dinâmica de «montanha-russa», a voragem dos planos e das situações, a premissa genial do «concurso vs. respostas» e a banda sonora possante tornam o filme no bálsamo contra a crise de que estávamos à espera.

Outra crítica AQUI

QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
De Danny Boyle (2008)

* * * *
Habituado a surpreender, Danny Boyle acertou finalmente na fórmula que lhe traz a fama, os prémios e as atenções do público. O filme, que é uma bela homenagem ao amor, ganha densidade pelo retrato de contrastes de uma Índia a querer ser desenvolvida e por uma ideia extraordinária feita a partir de um popular concurso televisivo. Mas há muito mais para ver nesta jornada movimentada, ruidosa e hipersensível... No fundo, a mais-valia está na energia contagiante. É raro encontrarmos este ripo de ritmo sem nos cansarmos. Danny Boyle não cansa, surpreende.

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