27 de janeiro de 2008

O cinema silencioso de Bergman







INVEJA.
«Toda esta conversa. Não é preciso discutir a solidão. É uma perda de tempo.» ESTER (Ingrid Thulin)

Se há cinema que assenta no poder das emoções, o legado de Ingmar Bergman é uma verdadeira «manta de retalhos» psicológica que se esforça por transpor em imagens o lado intrínseco dos sentimentos, recorrendo ao grande plano para mostrar ímpetos aparentemente insondáveis.

Quando lhe perguntaram quais eram os motivos das suas histórias, o que desejava realmente ao criá-las, o realizador sueco gaguejou justificando-se que a pergunta era difícil e perigosa. Ainda assim, a resposta lá apareceu : «Tento dizer a verdade sobre a condição humana, a verdade como a vejo.»

O que é habitual nos seus melodramas intimistas é vermos pessoas com relacionamentos ambíguos, de tal formas expostas que rapidamente afastam os rodeios que as rotinas sociais impõem.

Lembrei-me disso recentemente na descoberta da obra «O Silêncio», um pequeno filme de 1963 em que Bergman volta a tentar superar-se com a possibilidade de contar uma história recorrendo principalmente ao poder do som e dos olhares.

Até porque na cidade onde as irmãs Ester e Anna vão dar, com o pequeno filho da segunda, os seus habitantes expressam-se numa língua estranha que as força a comunicar de outras formas. Mas o mais absorvente não é essa dificuldade em comunicar.

É mesmo o hotel onde as duas mulheres se alojam, com corredores luxuosos e personagens bizarras - desde o mordomo de ar patusco ao grupo de anões em estranho ambiente circense.

Depois há angústia de Ester, que vê o fim a aproximar-se e a irmã que não cede aos ímpetos de um corpo em ebulição.

No final, o que fica é mais um exercício perturbante, ruidoso na sua ausência de palavras e a convicção de que Bergman era inabalável no modo como conseguia ir muito longe nas tensões emocionais entre as suas personagens.

Algo que, hoje em dia, Lars von Trier, por exemplo, se tentou aproximar. Mas desembocando, muitas vezes, no atalho da misoginia e da violência exacerbada. Não, Bergman é mais subreptício. E por isso ainda mais esmagador
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1 comentário:

andrellv disse...

Há anos que digo que acho que o Bergman é o realizador mais "humano" na história do cinema. Tudo em, como costumo explicar às pessoas que me perguntam "como é Bergman?", mais ou menos 90 minutos de pessoas a interagirem umas com as outras.

Era um realizador sublime, que tocava as fragilidades e os receios do ser humano de uma forma tão simples como avassalador. The silence é um exemplo, winter light é outro, Shame é outro... isto para não recorrer aos mais óbvios.

Blah blah blah... nota-se muito que gosto de Bergman?