21 de julho de 2006

Sentir Hitchcock ao ar livre

Hoje é dia de Alfred Hitchcock ao ar livre na Cinemateca. Tal como amanhã e todos os fins-de-semana de Julho e Setembro. A "culpa" é do evento de Verão que o Museu do Cinema promove há três anos: as "Sessões de Esplanada", com a exibição em ecrã gigante de clássicos em ambiente descontraído... Um sentimento que nem sempre é difícil de conseguir quando é do "mestre do suspense" que se fala. Iniciado com "Os Pássaros", o ciclo "Na Esplanada com Hitchcock", com sessões sempre às 22.30, é um mosaico bastante completo da obra do realizador britânico, oscilando entre o seu período inicial, com obras inglesas a preto-e-branco onde testou fórmulas e uma hipótese de estilo para o género "thriller", e o da sumptuosidade norte-americana, já com o prestígio e os meios que lhe permitiram criar clássicos de luxo. O ambiente ao ar livre permite uma experiência diferente e um novo olhar para (re)ver uma cinematografia acessível nos ciclos "interiores" do Museu do Cinema ou no formato DVD. Agora, os serões podem ser diferentes. Porque permitem sentir na pele de novo o gosto pela claustrofobia do mestre que chegou um dia a dizer que os actores deviam ser tratados como gado. Afinal, eram meras peças para compor a sua arquitectura cinéfila que o levaram a criar um culto inédito em torno da sua figura enquanto cineasta visionário.

Pecado do Dia: Soberba

O serão de hoje inscreve-se sob o signo da dúvida e do desespero que os segredos podem gerar no convívio conjugal. Suspeita, de 1941, não é dos títulos mais óbvios da carreira de Hitchcock mas foi um dos primeiros sinais do requinte e da consciência plena do seu estilo que o mestre imprimiu por terras norte-americanas. Cada cena tem já a sua sombra (e há até o habitual "cameo"...), cada movimento de câmara revela já uma perfeita noção dos contornos da envolvência narrativa e psicológica e... depois há os efeitos de "suspense", aqueles pequenos truques cinematográficos para realçar até que ponto Lina (Joan Fontaine, vencedora do Óscar de Melhor Actriz por esta prestação dúplice) deve suspeitar das intenções do marido (o eterno galã de comportamentos ousados, Cary Grant). Suspeita deu que falar devido à obrigação de Hitchcock em alterar o final com o medo do estúdio RKO de que o público se afastasse do filme se este fosse demasiado cruel. É pena... porque é precisamente o fim o mais morno de uma história que tem ainda uma curiosa alusão a Agatha Christie. Cenas memoráveis? A caminhada de Cary Grant com um copo de leite fresco nas mãos, que sintetiza a ambiguidade que Hitchcock conseguia criar com um simples (afinal, bastante complexo...) jogo cénico. Hoje, às 22.30 no Museu do Cinema ou em DVD numa edição da Costa do Castelo. * * * *

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