26 de outubro de 2007

NA SALA ESCURA: A comédia em dois actos







GULA.
«O casamento é como uma tensa e nada cómica versão de 'Everybody Loves Raymond', só que não dura 22 minutos. Dura para sempre.» PETE (Paul Rudd) in Um Azar do Caraças

Rir com gosto no cinema começa a ser muito raro. Ou os exercícios são comédias desbragadas e resvalam para o escatológico, ou tornam-se experiências monótonas e rotineiras.

O que se passa é que, de repente, temos em exibição duas comédias que, embora distintas, acabam por ser bons exemplos de como a indústria norte-americana não precisa de gastar balúrdios para acertar na fórmula do humor.


UM AZAR DO CARAÇAS (alguém aniquile quem se lembrou desta tradução estupidificante!) e SEM RESERVAS têm propósitos e targets distintos, mas mostram como a comédia está cada vez mais ligada aos afectos. O primeiro caso é uma inteligente versão de como uma relação pode começar pelo fim, enquanto o segundo é o modelo convencional da comédia romântica de traços dramáticos, cuja mais-valia é passar-se nos meandros do requinte gastronómico.

Tanto um, como o outro prometem abrir o apetite! E tirar a barriga de misérias depois de tantos tiros ao lado no registo da comédia.


UM AZAR DO CARAÇAS
De Judd Apatow (2007)

* * * *
Por que é que esta comédia funciona? Tem humor escatológico, caras pouco conhecidas, brinca com o tema sensível da gravidez e não inova ao nível das relações humanas. A verdade é que, embora não inovando, UM AZAR DO CARAÇAS inverte as coordenadas da comédia romântica e possibilita um toque realista e algo desconexo do amor e de outros sentimentos adjacentes. O par protagonista encaixa como uma luva e anda às turras com a vida real tal como nós. O resultado é genuinamente divertido e humanista, uma combinação em vias de extinção. A melhor comédia do ano!

SEM RESERVAS
De Scott Hicks (2007)

* * *
É um remake do filme Bela Marta (2001), mas funciona tal como funcionou, por exemplo, «The Departed - Entre Inimigos». Este drama que gira em torno de uma chef de cozinha que se vê a ser mãe à força e confrontada profissionalmente por um rebelde é uma espécie de «Ally McBeal» de avental ao peito ou um «Ratatui» em que quem percebe de iguarias é uma (ainda) charmosa Catherine Zeta-Jones. Com todos os ingredientes certos - até o cliché do amor contrariado funciona! - o filme quase que é enjoativo, mas termina na altura certa. Assim, é só um exercício simples e sensível onde se nota o dom do realizador de «Shine - Simplesmente Genial».

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