30 de janeiro de 2009

NA SALA ESCURA: 3 grandes surpresas






AVAR
EZA. «Este foi o melhor dia de sempre.» LEE CARTER (Will Poulter) em O Filho de Rambow

A primeira descoberta deu-se logo em Dezembro, num dia chuvoso como este: ou ia ver «Bolt», a última animação sofisticada da Disney, ou uma produção britânica da qual já tinha ouvido falar bem, mas sem grande detalhe. Arriscar no «Filho de Rambow - Um Novo Herói» foi a opção e não podia ter sido mais certeira.

Herdeira de uma tradição de cinema juvenil à qual associamos a década de 80, esta produção hilariante de Garth Jennings, o mesmo realizador de «À Boleia Pela Galáxia», brinca com o próprio cinema, nos tempos do vídeo amador, do VHS, das câmaras de filmar pesadas, da música «punk», dos The Cure, dos Depeche Mode, dos filmes bruscos e básicos de Sylvester Stallone, das cristas no cabelo, das calças justas e brilhantes... de tudo o que convoque a década de 80.

Pelo meio há uma vontade em mostrar como a infância é o lugar do risco, da acção sem constrangimentos, numa energia que passa muito bem para o filme sobre como dois colegas da escola, de feitios contrários, decidem dirigir uma sequela do filme «A Fúria de um Herói».

O que «Filho de Rambow - Um Novo Herói» ajudou a comprovar é que existe ainda um largo espaço para o cinema comercial se aproximar da experimentação de géneros e fórmulas.

Os filmes, numa vez ou outra, até chegam às salas de cinema, mas a promoção dos mesmos é inexistente. São obras de pendor independente, que resultam quer dramática quer tecnicamente, mas como não possuem nenhum valor acrescentado mediatizado escapam à grande maioria.

Mais ainda do que o sólido cinema de autor, que até é bastante impulsionado pela imprensa especializada e encaminhada para salas de cinema específicas. Neste ponto, o início de 2009 comportou mais duas óptimas experiências: «Os Três Macacos» e «A Valsa Com Bashir».

O primeiro caso é mais um sinal de que o novo cinema turco tem pernas para andar. A forma como Nuri Bilge Ceylan domina a câmara permite-lhe obter resultados únicos ao nível do melodrama. É a ruína de uma família que se segue com particular proximidade, num jogo de segredos e enganos elevado por óptimos enquadramentos, planos fixos intensos e gosto por deixar o cinema respirar, dando espaço a silêncios e momentos mais longos para se seguirem gestos e expressões.

O clima entra pelo filme e pelas personagens dentro, que não são mais do que figuras de perdedores à procura de um sentido no meio de um colossal caos afectivo.

Por fim, «A Valsa com Bashir» é um bela obra de arte, em que as imagens se fazem a partir de desenhos de toque artístico e os traumas de guerra são recordados com peculiar ênfase e sensibilidade.

Ao ser um trabalho de animação, este documentário torna-se mais intimista e eficaz no modo como explora as contradições neste tipo de cenário. Raramente se viu uma proposta tão original quanto esta.

Outras críticas AQUI

O FILHO DE RAMBOW - UM NOVO HERÓI
De Garth Jennings (2008)

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Foi dos mais interessantes exercícios de produção britânica do ano que passou e que merecia muitíssimo mais destaque. A ideia de juntar duas crianças no esforço para realizar um filme de acção é de génio e concretizada com muita imaginação e rebeldia. Daquela saudável e que teve um cunho próprio na década de 80, alvo de certeira homenagem nesta comédia que é também um retrato de descoberta. O cinema ri-se aqui de si próprio.

OS TRÊS MACACOS
De Nuri Bilge Ceylan (2008)

* * * * *
Palma d'Ouro no último Festival de Cannes, Nuri Bilge Ceylan aprofunda o seu estilo e torna-o mais figurativo, ao sabor de uma tragédia familiar. Com óptimos pormenores técnicos e poucos diálogos, esta história despedaçada engrandece-se enquanto melodrama e mostra como a verdade pode ser violenta. A crueza, quer dos sentimentos, quer dos planos, dá uma força brutal a este conto despedaçado.


A VALSA COM BASHIR
De Ari Folman (2008)
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O filme animado quer ser documental ou o documentário quer ganhar espessura à custa de uma animação de traço pessoal. Os géneros são o menos, até porque o propósito de Ari Folman é usar as imagens como forma de tornar mais expressiva a sua denúncia: o cenário de guerra é absurdo e deixa marcas psicológicas profundas. Seja do lado de quem perde ou de quem ganha. O toque artístico das animações é assombroso.

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