7 de junho de 2007

NA SALA ESCURA: Descobrir a inocência

GULA. «Fecha os olhos e mantém a tua mente bem aberta.» Leslie Burke

Foi uma boa surpresa aquela que descobri num singelo visionamento a convite, num sábado de manhã e com uma sala apinhada de crianças, mas do qual na altura me esqueci de partilhar as impressões. Agora tenho vontade de escrever sobre O SEGREDO DE TERABÍTIA, uma doce fábula sobre o poder da imaginação que se encontra nos antípodas das recentes investidas do género do cinema fantástico como HARRY POTTER ou AS CRÓNICAS DE NÁRNIA. A vontade talvez venha porque há poucos dias (quase uma semana) fui tio, de uma minúscula Clara que já é grandiosa na sua vulnerabilidade de quem dá os primeiros suspiros, choros, gestos e expressões num mundo que se toca pela primeira vez. A sua pureza e inocência extremas, de quem descobre os primeiros reflexos do que é a vida (primeiro corpo e impulsos e só mais tarde mente e afeições) fez-me ter vontade de ser novamente criança, descobrir tudo pela primeira vez e perceber que a ingenuidade é talvez das sensações mais confortáveis de todas. No filme, muito bem construído e mais contido do que se poderia prever numa produção para crianças, o que se conta é a amizade oscilante entre duas crianças vizinhas (excelentes Josh Hutcherson e Anna Sophia Robb) que, face ao cinzentismo do dia-a-dia, se isolam num bosque e simulam aventuras, vivem peripécias «guerreiras» em que a imaginação é a força motriz e se deixam absorver pelas leis que só o pensamento em convulsão, como o é o da infância, consegue criar e pôr em prática. Apesar do final não ser totalmente feliz, faz sentido e não corrompe a história, uma das mais bem contadas do cinema comercial dos últimos anos. No final, também eu quis voltar para o meu mundo de fantasia paralelo dos primeiros anos. Não o fiz. Mas voltei a lembrar-me dele quando há poucos dias a Clara teve um dos seus primeiros pestanejares nos meus braços. Já quer abrir os olhos para a vida. Aquela enorme que tem pela frente. Bem-vinda!

O SEGREDO DE TERABÍTIA

de Gabor Csupo (2007)

* * * *
Este singelo retrato sobre a amizade de contornos oníricos entre dois jovens inadaptados na escola, e que resolvem refugiar-se num mundo imaginário de criaturas fantásticas e missões impossíveis, é tão simples que parece estranho nunca ter sido concebido antes... E tudo bate certo: o elenco é tocante, o humor genuíno, as convulsões da história fazem sentido e os sentimentos impõem-se sem lamechices. O desconhecido realizador Gabor Csupo acertou em cheio nesta sua primeira longa-metragem infantil, que é mais adulta do que muito filme para maiores de 18. Recomenda-se: a ver, com o sorriso da ingenuidade no canto dos lábios.

1 comentário:

emot disse...

Adorei o filme!
No meu caso, um pouco também por ter irmãos mais pequenos e por ter crescido numa zona como aquela, com um pinhal, onde dava para imaginar mundos bem mais aliciantes.