1 de junho de 2007

NA SALA ESCURA: A obsessão de não saber

IRA. «Eu... Preciso de saber quem ele é. Preciso... de me manter ali, olhar para ele nos olhos e preciso de saber que é ele!» ROBERT GRAYSMITH (Jake Gyllenhaal, ZODIAC)

Já se sabia que o cinema de David Fincher era essencialmente dominado por uma obsessão: fosse de um serial killer perante o seu sentido de missão, como em SETE PECADOS MORTAIS, de um grupo de resistentes para matar um ser alienígena como em ALIEN3 - A DESFORRA, ou de um homem em torno do seu modelo de identidade, como em CLUBE DE COMBATE. Agora, David Fincher regressa ao género que o tornou famoso, o thriller sufocante em torno de um assassino em série real, que se confunde com grande parte da história dos Estados Unidos nos últimos 30 anos. ZODIAC é um thriller excepcional e o seu principal mérito reside no facto de não ser a identidade do criminoso o mais importante, mas antes a forma como a necessidade de querer saber a identidade do mesmo corrói a vida e a mente de quem com ela se confronta. Ou seja, este é antes um ensaio sobre o thriller, os seus mecanismos e o medo de desconhecer verdadeiramente a identidade de quem mata sem grande razão uma série de indivíduos não relacionados entre si... E Fincher é soberbo no modo de desconstruir as regras do policial, na construção dos perfis humanistas das pessoas que seguem o famoso criminoso e na direcção do seu elenco. Se Jake Gyllenhaal confirma o seu dom para personagems complexas, Robert Downey Jr. é um excelente secundário e Mark Ruffalo volta a dar uma lição de discrição. Depois há aqueles planos que Fincher demora dezenas de takes a conseguir obter. O cinema de Fincher cheira a perfeccionismo compulsivo e ele é já um dos nomes do cinema mais recente norte-americano a merecer créditos por re-inventar os vários géneros que já experimentou. E nunca com a solidez e complexidade dramática de ZODIAC.

ZODIAC
de David Fincher (2007)
* * * *
Um assassino comunica com cifras e faz uma nação tremer de medo. Ao certo ninguém fica a saber quantas baixas o criminoso fez e quem investiga o caso começa a perder a razão. Fincher filma a dúvida e o desespero com um perfeccionismo desarmante e constrói um dos mais interessantes policiais dos últimos anos onde o que mais interessa não é saber quem matou mas analisar as repercussões psicológicas que essa dúvida gera num grupo de polícias e jornalistas. O resultado final é excelente. Destaque para a sequência passada na casa de um idoso que supostamente desenha cartazes de cinema. Quem cria um efeito de sugestão como esse só pode ser um grande realizador. Dos maiores.

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