AVAREZA. «A proximidade de certos climas e situações retratados ao longo da viagem tem reminiscências em histórias conhecidas e queridas, se converteram num relato autobiográfico.» PABLO TRAPERO, Realizador
Por ano são cerca de 50 filmes e, com um número tão elevado num continente em que a concorrência mais próxima só vem do Brasil, as consequências sentem-se no ecrã: o recente florescimento do cinema argentino gerou a proliferação de pequenas obras, com níveis de produção muito baixos e reveladoras de um esforço das equipas técnicas envolvidas para levarem a produção até ao fim com sucesso. Nomes de cineastas como os de Lucrecia Martel, Lisandro Alonso, Daniel Burman ou Martín Rejtman despertaram a atenção e permitiram que esta indústria, ainda assim bastante apoiada pelo Estado argentino, crescesse e não sentisse os efeitos da crise económica generalizada que afectou o segundo maior país da América do Sul nos primeiros anos deste novo século. A Argentina é, de facto, dos poucos países com graves carências no seu nível de desenvolvimento financeiro que dispõe anualmente de chorudos subsídios estatais para cinema. A maior parte é canalizada para projectos mediáticos, negligenciando obras de natureza marginal que parecem fazer da contenção de meios ingrediente necessário para gerar novas ideias visuais. FAMÍLIA RODANTE, filme de outro nome da nova geração de realizadores argentinos a reter, Pablo Trapero, reflecte esta tendência por aproveitar o conceito de road movie e adaptá-lo à tradição familiar sul-americana. A história resume-se em poucas palavras: Emília (Graciana Chironi), matriarca de uma numerosa família, convoca todos os seus parentes mais próximos para a acompanharem numa viagem de mais de um milhar de quilómetros e assistirem a um casamento onde a velha senhora será madrinha. O meio de transporte é uma apertada autocaravana para doze pessoas e muitos mais conflitos íntimos por resolver. Pouco convencional e sem receio de mostrar os pequenos «nadas» que definem uma personalidade, o filme descreve em pouco mais de hora e meia o fio ténue que liga este clã desconexo, num registo de filmagem quase documental. Em FAMÍLIA RODANTE, as cenas atravessam-se no ecrã de forma episódica, com planos aproximados para evidenciar o espírito de (des)união do vasto núcleo de personagens, interpretado na sua maioria por actores não-profissionais – a enternecedora Emília é, inclusivamente, interpretada pela avó do jovem realizador. Sempre em movimento, a acção desenrola-se também em sucessivos interlúdios que dão pistas para o objectivo pretendido pelo cineasta Pablo Trapero: demonstrar um imenso amor pelas relações humanas e pela tradição rural do seu país.
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