O sopro romântico do ano chegou discreto nas salas nacionais, mas tem mantido uma longevidade impressionante nas salas de cinema e... ainda bem. Por este motivo, tive a oportunidade de ver na sala escura um dos mais belos melodramas dos últimos anos, despojado de artifícios e digno representante de um tipo de cinema em vias de extinção: tonalidades clássicas, filmagem sensível e atenta aos pormenores, construção milimétrica das personagens e abordagem sensual do amor sem cair em demagogias carnais. LADY CHATTERLEY é uma soberba adaptação do romance «O Amante de Lady Chatterley», de D.H. Lawrence, que impressiona pela leveza da sua direcção, incisiva mas profundamente condescendente com as suas figuras. A relação metafórica entre o brotar da Primavera com a transformação interior de Constance (Marina Hands), enclausurada numa relação conjugal sem chama (dado o marido ser um arrogante burguês inválido), assim que se entrega a Parkin (Jean Louis Coullo'ch), o guarda-caça da sua propriedade, é de uma beleza extrema, que culmina com a decoração floril inventiva da personagem genialmente interpretada por Coullo'ch. De mansinho, se constrói um belo tratado do amor impulsivo, de um afecto intimamente ligado ao corpo e aos seus desejos. A relação entre o par protagonista contorna o preconceito de épocas passadas numa bela epopeia sensível e devolve ao cinema europeu a história de amor delineada como o novelo folhetinesco para adultos, que não esconde a entrega carnal, antes a encara como um passo fundamental para a união. Só por isso, e por ser um filme que renova convicções, LADY CHATTERLEY deve ser visto por quem acredita no poder dos sentimentos e se deixa envolver pela intensidade de um retrato que contorna tudo e deixa ver de perto qual é a verve do amor.
Jogo de luxúria intenso, mas condigno com o sentimento premeditado das personagens. É uma das obras-primas do ano e um exemplo de como o cinema francês ainda é uma referência na gestão de afectos. Quem o vê peca com o olhar, mas não pela nudez reincidente das personagens, antes por assumir uma veia de voyeur, ao partilhar a intimidade de dois seres que se descobrem, quando já tudo parecia perdido.
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